Leia aqui a segunda parte da entrevista.
Assiste-se, por estes dias, a um verdadeiro frenesim de compras. A celebração do Natal está hoje desfocada do seu verdadeiro sentido por uma visão comercial e de consumo?
O consumismo é uma realidade que se impôs à nossa cultura e que é transversal a todos os momentos e a todas as situações. Hoje, a forma que a sociedade, pelo menos a ocidental, encontrou para celebrar, fazer festa, assinalar distâncias, celebrar partidas, celebrar chegadas ou viver memórias, é através do consumismo. Hoje, é o ser humano que está para as coisas e não o contrário. Elas dominam verdadeiramente o nosso dia-a-dia. No entanto, tenho muita esperança na capacidade, na resiliência e, sobretudo, na força de domínio e de controlo que o ser humano tem. Por debaixo desta crosta de tanta azáfama e de tanto consumo, o ser humano esconde uma necessidade autêntica de sentido de vida, de proximidade, uma fome de preenchimento. A missão da Igreja nos dias de hoje é a de indicar e de propor a esta sociedade que a fonte onde pode encontrar a saciedade não está nos centros comerciais nem no consumismo, mas sim nas pessoas e no próprio Deus. O consumismo é um fenómeno que tem esta dupla vertente. Por um lado, surpreende-nos, porque é uma agitação sem sentido, um consumismo quase descontrolado, mas, por outro lado, revela-nos até que ponto é grande a sede que o ser humano tem de algo mais profundo.
A Igreja está a saber preencher esse vazio, essa fome de preenchimento de que falou?
A Igreja nunca deixou de, pelo menos, tentar. E continuadamente está a fazê-lo. Sempre que uma pessoa é baptizada - e, felizmente, há muitos baptismos -, afirma-se o verdadeiro sentido dessa celebração, recordando ao Homem que ele é feito não para as coisas - as coisas é que foram feitas para nós - , mas para alguém.
Muitos dos baptismos são de crianças cujos pais não são praticantes, mas que fazem questão que os filhos recebam o sacramento.
É preciso destrinçar a questão em três momentos: primeiro os filhos, depois o baptismo e, por último, a condição dos pais. Neste momento, o nosso foco em Portugal deve estar no nascimento. O grande drama que a sociedade portuguesa enfrenta é o da natalidade e da carência de nascimentos. As estatísticas são preocupantes. Não estamos a ser capazes de renovar a sociedade. Se não há crianças, o futuro está comprometido. Este é, para mim, o problema número um do País. Depois, todas as crianças são filhas de Deus, tenham pais casados ou não, sendo certo, que é importantíssimo que os pais vivam o vínculo matrimonial, inspirado e consagrado no sacramento. Isso faz parte dos requisitos para encontrar o sentido de vida para a própria existência.
Estes são também tempos em que, muitas vezes, para dar resposta à febre do consumismo, o trabalho se tornou o centro do mundo das pessoas, roubando tempo à família e ao lazer. Esta é também uma realidade perturbadora?
É preciso dizer com todas as forças que, em Portugal, o trabalho não é devidamente reconhecido nem recompensado. Muito do nosso povo tem de sobreviver, com sacrifício e muitas dificuldades, com o salário mínimo nacional. É um escândalo. Depois, verificamos que há profissões onde o ordenado mínimo paga, por vezes, situações de autêntica escravatura, porque não há horários e porque não está regularizada a quantidade de trabalho a praticar. A sociedade exige ao cidadão uma dedicação e uma entrega ao trabalho, que se tornou particularmente visível ap&oa
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