Entrevista

João Botelho: “Esta liberdade é um luxo. Não tenho um tostão, mas só fiz o que quis”

13 nov 2022 14:30

Fuma quatro maços por dia quando trabalha e garante que ainda se diverte a filmar uma certa ideia de didatismo e luta contra a perda de memória

Nascido em 1949, em Lamego, João Botelho soma inúmeros prémios nacionais e internacionais, incluindo nos festivais de Berlim e Veneza
Ricardo Graça

Em 2022, estreou dois filmes: O Jovem Cunhal, sobre o histórico dirigente comunista, e Um Filme em Forma de Assim, inspirado na vida e na obra de Alexandre O'Neill, que no sábado, 5 de Novembro, foi exibido no Teatro Miguel Franco. O cineasta João Botelho passou por Leiria e conversou com o público, numa iniciativa da Leiria Cidade Criativa da Música Unesco para assinalar o Dia Mundial do Cinema. Nascido em 1949, em Lamego, João Botelho soma inúmeros prémios nacionais e internacionais, incluindo nos festivais de Berlim e Veneza. Estudou engenharia, foi cineclubista e crítico, trabalhou como professor, ilustrador e designer gráfico e desde a primeira longa-metragem, Conversa Acabada, de 1981, sobre a amizade e a correspondência entre Fernando Pessoa e Mário Sá-Carneiro, várias vezes levou para o grande ecrã figuras e obras fundamentais da cultura e da história portuguesa. É o que faz nos dois filmes estreados já este ano, e também, nos anos recentes, em O Ano da Morte de Ricardo Reis (2020), Peregrinação (2017) ou Os Maias: Cenas da Vida Romântica (2014).

Esteve em Leiria a conversar com o público, como esteve em Alcobaça, recentemente. Sente falta do tempo em que o cinema era um acto colectivo, mais do que é hoje?
Sinto. O cinema, quando eu apareci lá, quando me apanhou, era uma espécie de missa, era uma coisa de comunhão. Foi o Tubarão que nos comeu. Abriu a boca e comeu o cinema independente todo, no mundo inteiro. Quer o Spielberg, quer o Lucas, eram pessoas cultas, mas inventaram um divertimento infanto-juvenil. Antes, também havia, mas não eram dominantes. Fez renascer a indústria de Hollywood, mas matou os outros todos. Não é só uma questão portuguesa: 85% das pessoas que vão ao cinema são miúdos com menos de 17 anos. Os adultos vêem streaming, vêem séries. O que dá dinheiro no cinema: o bilhete custa sete euros, mas a Coca-Cola e a pipoca custam 14.

Daí dizer que é mais um negócio do que uma arte?
É um negócio e um negócio infanto- juvenil. Os adultos sentem-se mal, não gostam de ir. De qualquer maneira, esta ideia vai ter um problema. Eles não olham para o ecrã, olham para o iPhone. A narrativa, a ficção, a piada, é no iPhone.

Vêem-se mais filmes no telemóvel, na televisão ou no computador do que na sala de cinema.
E, sobretudo, eles vêem-nos a correr. Há uma vertigem do tempo. As pessoas não têm tempo para olhar nem para ouvir.

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