Como lhe surgiu a ideia de organizar o In Music, encontros/ tertúlias com músicos, em Leiria, no Teatro Miguel Franco?
Foi numa conversa com o vereador do Pelouro da Cultura de Leiria, Gonçalo Lopes. Estávamos a falar das pessoas do meio artístico e musical e dos artistas que eu conhecia e chegámos à conclusão que seria interessante trazer a Leiria músicos e professores conceituados, para falarem do seu trabalho em pequenas conferências musicais. A cidade precisa de conhecer e entrar em contacto com outras pessoas e artistas.
O formato é o de uma tertúlia?
Faço algumas perguntas e permito a participação do público. O músico explica algumas peças e toca-as. Acredito que, se o público entender um bocadinho da música que está a ouvir, ser-lhe-á muito mais fácil, depois, escutar a peça completa e perceber o que o autor quis transmitir. É uma espécie de concerto didáctico. Aliás, a minha ideia é que 50 por cento da duração do encontro seja com música e, o restante, seja com conversa.
Quem já esteve nas conversas do In Music?
Em Fevereiro e Março, esteve o Hugo Assunção, professor na Escola Superior de Lisboa, e o premiado tubista de Alcobaça Sérgio Carolino. O In Music prepara-se para iniciar o seu novo ciclo de seis palestras e concertos musicais no Teatro Miguel Franco, em Leiria, com pessoas como os maestros Victorino de Almeida e Pedro Neves. O próximo encontro será dedicado à trompa, com os músico Rodrigo Carreira, professor na Escola Artística de Música do Conservatório Nacional, e Luís Duarte Moreira, músico na Orquestra da Casa da Música e na Orquestra Sinfónica da Galiza. Nas primeiras conversas, no início do ano, o público compareceu, mas não estava tanta gente quanto eu gostaria. Sei que é difícil encher a sala do Teatro Miguel Franco para uma palestra, mas acredito que, agora, com um maior envolvimento das bandas e orquestras, e o apoio da autarquia, iremos ter uma boa casa na próxima edição. As pessoas fazem muitas perguntas. Gostam de saber quanto tempo é que um músico precisa para estudar, como entrou no mundo da música, o que acham do ensino em Portugal...
E o que acham do ensino em Portugal?
É uma pergunta com uma resposta difícil. Eu, por exemplo, estudei no estrangeiro e foi um grande choque chegar lá... um choque de cultura. Mesmo assim, penso que os portugueses queixam-se muito e afirmam, por exemplo, que na Alemanha há muitos concertos... Aqui, em Lisboa e no Porto, também os há todas as semanas. Não há fora dos grandes centros, embora se note que começa a haver mais espectáculos. Estudei em Leipzig, onde viveram compositores como Bach, Schumann e Wagner, e sente-se uma magia musical. Aqui, algumas escolas funcionam muito como um negócio e não de acordo com a paixão da música. Se calhar, precisamos de mais tempo. Afinal, a cultura musical na Alemanha já tem séculos. Com esta iniciativa, gostaria que as pessoas começassem a ir às salas de concertos com outro apetite e vontade.
Há dificuldade de angariar público para eventos deste tipo?
Há. A primeira vez que organizei concertos, foi há uns anos, com os espectáculos Opus 1 e Opus 2. O primeiro tinha bandas de rock e músicos mais do pop-rock e a casa encheu. No segundo, elevei a fasquia e convidei amigos que vieram de Amesterdão, Madrid... alguns dos melhores músicos que conheço. Foi um desastre. Estavam 60 pessoas. Foi um choque de realidade. O primeiro concerto encheu com os amigos e familiares dos músicos, mas, no segundo, com excelentes artistas que não eram cá conhecidos, isso já não aconteceu. Ainda me disseram que o primeiro concerto é que tinha sido mesmo bom. Por isso, a ideia do In Music é tornar a música acessível e perceptível a todos: músicos e não músicos. Nas primeiras conversas, num universo de quase 100 pessoas, estavam apenas uns cinco músicos. É muito pouco. Estou agora a convidar as escolas de música a levar os seus alunos ou professores a estar presentes. Mas é difícil conseguir a sua participação.
É um esforço de pedagogia numa cidade que quer ser candidata a Capital Europeia da Cultura?
Quando comecei este projecto ainda não sabia dessa aspiração, mas veio a calhar, embora a cultura não seja só música, é certo. Penso que os convidados que estão programados são pessoas de grande valor. Por exemplo, Pedro Neves de quem, se calhar, não se ouve falar por Leiria, é o maestro que todas as semanas manas dirige a Orquestra Gulbenkian, a Metropolitana ou a da Casa da Música. Tê-lo em Leiria, é um grande orgulho. Sempre quis fechar o ciclo de conversas com chave de ouro e o facto de o maestro Victorino de Almeida ter aceitado estar presente, tocar e falar de música, vai ser um privilégio. Sei que ele vai encher o teatro, mas gostava que as pessoas fossem ouvir os outros convidados também.
Que outros projectos pessoais tem em mãos?
Há uns meses, criei o espectáculo A Trompa e a Disney, no Teatro José Lúcio da Silva. Contámos com bandas de rock da cidade, o coro do Ateneu, a escola de ballet Staccato... Foi um concerto que mexeu com muitas pessoas de Leiria. Estamos a lutar para a Capital Europeia da Cultura e é bom que haja mais parcerias como esta. Nesse concerto, coloquei os meus alunos de banda filarmónica a tocar comigo e senti que eles tinham uma grande necessidade de tocar num palco. Gostaria de voltar a organizar algo semelhante, mas com outro tema. É uma ideia que ainda não está finalizada.
Amor pela música
Natural de Cortes, 28 anos, Mickael Faustino iniciou-se no mundo da música na banda da Filarmónica das Cortes, Leiria. Concluiu a licenciatura na Esmae, no Porto, e, de lá, seguiu para o mestrado na Hochschule für Musik und Theater, em Lepzig.
O trompista integrou algumas das mais prestigiadas orquestras de jovens do mundo como a Gustav Mahler Jugend Orchester, Schleswig Holstein Orchester Academy ou The World Orchestra.
Regressou a Portugal e, em Leiria, está a dar aulas nas bandas filarmónicas da região, além de ter vários projectos musicais e de ser presença assídua na Orquestra Gulbenkian, em Lisboa, e na Casa da Música, no Porto.