Sociedade

Paulo Borges: “há um Portugal que não se limita a tricas políticas, ao futebol, ao escândalo e à corrupção”

27 dez 2018 00:00

Entrevista | "Pertencemos à Natureza, mas achamos que estamos fora e acima dela".

Jacinto Silva Duro

Acredita que a Europa actual, maioritariamente leiga, mas de fundo cristão, poderá alguma vez acolher as vagas de muçulmanos que cá procuram refúgio? Quem acabará por se adaptar a quem?
Não tem havido moderação, mediação ou temperança. É evidente que, sempre que povos diferentes se encontram, se não existir flexibilidade mental de um lado e outro, há conflito e sofrimento. Quem chega a uma nova cultura é natural que se procure adaptar sem abdicar dos princípios e valores fundamentais da sua própria cultura, religião ou tradição espiritual. O próprio Cristianismo também começou com um refugiado - Cristo, a sua mãe e São José eram refugiados, e estamos a comemorar uma família de refugiados. É paradoxal que uma cultura que se diz cristã não se abra ao outro, não pratique o fundamental da tradição cristã e abraâmica de acolher bem o estrangeiro. Esses valores estão na tradição cristã, mas o problema é a sua colocação em prática, por parte dos cristãos. A nossa civilização há muito que se diz cristã, mas o que é posto em prática não são os valores cristãos. Uma civilização realmente cristã, só poderia acolher o outro e respeitar a diferença.

Ao mesmo tempo que as relações entre Portugal, Angola e outros antigos territórios coloniais portugueses se estão a estreitar, teme pelas relações entre o Brasil de Bolsonaro e o nosso País?
As relações entre os povos e culturas passam por outros caminhos e dimensões que não são apenas as relações entre Estados. Bolsonaro ainda é uma incógnita e não sabemos se irá colocar em prática tudo o que anunciou - esperemos que não. Quando alguém tem um discurso extremista, muitas vezes, após a eleição não coloca em prática tudo o que prometeu na campanha. Estive no Brasil, duas semanas após a eleição, e encontrei muitos brasileiros completamente deprimidos, a pensar em sair do país. Professores, académicos e muitos outros, não apenas intelectuais queriam vir para Portugal. O Brasil tem imensas potencialidades no seu povo, na sua cultura e acredito que não será um dirigente político que deitará tudo a perder. Há uma certa tensão e desconfiança entre brasileiros e portugueses, mas há uma ligação pelo facto de falarmos a mesma língua, somos povos do Sul, com afinidade cultural e gostamos de desfrutar da vida de um modo que não é apenas o de uma civilização industrialista. Seria interessante um estreitamento nas relações entre os povos de língua portuguesa, que não passasse só pela fachada das relações entre Estados. Seria bom que os portugueses conhecessem mais as culturas brasileira, angolana ou moçambicana, e o mesmo da parte dos povos que falam português.

Leia aqui a primeira parte da entrevista
“Odiar é tomar veneno todos os dias, na esperança de que o outro morra”


Não conhecemos a nossa família?
Não conhecemos os povos que resultaram da nossa aventura histórica, com tudo o que ela teve de bom e de mau. Em Portugal, há a tendência para uma certa culpablização, como se agora fôssemos os mesmos que, há 500 anos, fomos pelo Mundo e vivemos do tráfico de escravos. Não somos! Há que desconstruir essa imagem traumatizadora, quer do colonizador quer do colonizado, e começar um novo ciclo.

Um Quinto Império?
Sim, a ideia de Agostinho da Silva. Nestes dois últimos anos, tive oportunidade de ter estado em  

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