Opinião

A imparável megalomania cultural de Leiria

16 mai 2022 16:00

O dinheiro faz silenciar muitas bocas

O desenvolvimento das sociedades assenta, substancialmente, nas dinâmicas inovadoras que são introduzidas no sistema produtivo.

Portanto, apresenta-se de fundamental importância a estreita relação entre a ciência (o conhecimento científico) e a tecnologia (a ciência aplicada).

Este é um dos principais motores de desenvolvimento dos territórios.

Temos como exemplo o cluster aeronáutico em Ponte de Sor, um pequeno município alentejano com cerca de 15 mil habitantes, cuja autarquia, desde 2017, já conseguiu atrair 36 milhões de euros de investimento (Expresso, 14/4/22).

Em termos constitucionais (Artigo 235.º), as autarquias locais devem visar a prossecução de interesses das suas populações.

Ou seja, um presidente de Câmara deve ser capaz de pensar e executar políticas públicas que promovam a equidade e a coesão territorial e, tanto quanto possível, estabelecer uma governança multinível (o poder local em cooperação com os vários actores locais, nacionais e internacionais).

Ora, em bom rigor, o poder de maioria absoluta na Câmara e na Assembleia Municipal fez instalar em Leiria um estado de absolutismo que gera uma governança assimétrica.

Em termos concretos, essa assimetria governativa é consubstanciada com várias decisões erráticas no âmbito da política cultural.

Em Leiria, a cultura tornou-se uma megalomania imparável e de esbanjamento do dinheiro público. E o dinheiro faz silenciar muitas bocas.  

A candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura e a criação da Rede Cultura 27 (RC27) foi um enorme falhanço, cujo presidente do conselho estratégico, João Bonifácio Serra, já resignou.

Mas quanto custou aos cidadãos este falhanço?

Para o presidente de Câmara custou 258.900 euros. No entanto, a Comissão Política de Secção dos PSD Leiria apurou, documentalmente, o valor de 894.781,34 euros.

Esta brutal divergência de valores já foi levada a Assembleia Municipal no dia 29 de Abril e, até ao presente momento, a RC27 não tem um relatório de contas que possa explicar, com verdade e rigor, o custo do falhanço.

E esta postura absolutista viola claramente a Lei n.º 73/2013 no que diz respeito ao princípio da transparência financeira que a Câmara deve ter com os cidadãos (Artigo 7.º).

Há ainda outro exemplo de megalomania cultural.

De acordo com o relatório de contas do Teatro José Lúcia da Silva (TJLS) de 2019 (antes da pandemia), a taxa de ocupação do Teatro Miguel Franco foi de 43,5% e a do TJLS foi de 59%.

Ou seja, a Câmara Municipal não é capaz de desenvolver uma programação cultural que encha as suas duas salas de espectáculos na cidade e, no entanto, vai construir mais duas salas no antigo Paço Episcopal no valor de 1.548.965,84 euros (Acta nº 3/22 de 28/3/22).

Isto não é apenas má gestão do dinheiro público.

É uma política cultural feita de opções erradas e megalómana.