Opinião
A terceto
Mais que as pessoas, são os lugares, por vezes as coisas, que fazem correr a memória. Pelo menos a minha.
Se as pessoas tendem a transformar-se, a serem o que não eram, a tornar-se, por magia, noutra coisa que não o que são – o olhar, por vezes, é enganador –, os lugares são gravados com o que lá vivemos e como vivemos, e que a memória conserva, mesmo que adulterado.
Vinha a descer a Rua Comandante Almeida Henriques, ali entre o largo da câmara e o Centro Comercial D. Dinis, a rua que já foi do restaurante Verde Pino, em tempos o melhor restaurante de Leiria, e que mais tarde foi a rua do Maybe, o strip club da cidade, olhando o castelo a flutuar no alto do seu morro entre as paredes do centro comercial, quando reparo que, mais em baixo, um espaço de medicina oral (fazendo fé nos vinis colados ao vidro), estava com ar degradado e de abandono.
E, de repente, lembrei-me que ali tinha sido o lugar onde tinha adquirido uma parte significativa da minha memória musical e da minha coleção de discos em vinil. Fora ali que existira a discoteca Terceto. Fora ali que comprara pela primeira vez Joy Division. O Still. O duplo ao vivo com capa de cartão rugoso, sóbrio, depressivo.
Fora também ali que comprara o triplo Sandinista! dos Clash e The Script of the Bridge dos meus mais que tudo Chameleons. Para poder comprar todos estes discos, que ainda existem, em caixotes, mas que ainda existem!, tornei-me ajudante nas limpezas caseiras – os tapetes à minha mãe, o carro ao meu pai.
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