Opinião
Cinema | Fogos e artifícios
O novo ano já não está assim tão novo.
Num ápice, voltamos à velocidade de cruzeiro e, com a nitidez de uma vaga memória de um filme antigo, assistimos, impotentes, ao esfuma(ça)r da euforia da expectativa.
Esgotados os foguetes, as canas, as bolas de 90 mil euros e as selfies com motivos natalícios, impõe-se o doloroso regresso à realidade e à espuma dos dias.
Deixei escapar a minha oportunidade de contribuir para a infindável e inútil lista de listagens dos melhores do ano. Tarde de mais.
Assim, com o ano já a gatinhar e depois de toda a gente ter opinado abundantemente, não me vale de nada dizer que, sim senhor, achei que o Joker, do Bong Joon-ho, é de valor e que o Joaquin Phoenix leva o filme às costas ou que o Parasitas, do Bong Joon-ho, justifica, na minha opinião, ter a caminha feita para ganhar o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro ou, ainda, que há muito tempo não era surpreendido como fui pelo Bostofrio, do Paulo Carneiro.
Mas... isso, agora, não interessa nada. Isto de listas e seleções vale o que vale. Todos o sabem, ainda que poucos resistam a não as fazer, mesmo que para si próprios ou em modo de isto-não-é-bem-uma-lista-porque-eu-quero-que-fique-claro-que-sou-completamente-anti-listas.
É uma condição humana, provavelmente relacionada com a ilusão da mudança que um novo ano potencia e promove.
Sejamos realistas: este é um calendário entre tantos possíveis e o recomeço da contagem dos dias nem sequer coincide com um fenómeno natural que justifique a sensação de início, enquanto bichinhos que passamos fugazmente pelo planeta.
Seja como for, não deixa de ser efetivo e potencialmente positivo que, ano após ano, sejamos envolvidos por uma sensação de fecho de ciclo que convida à reflexão e à ponderação.
Não me refiro a resoluções de Ano Novo. Essas, parece-me que servem mais os interesses de ginásios e farmacêuticas.
No meu caso em particular, julgo não existir resolução de novo ano que vá somar anos significativos à vida que me resta, me salve da calvície ou, bem entrado nos 40, me dote do físico de deus grego com que sempre sonhei (e sei que mereço).
Se calhar resoluções relativas à próstata estão mais perto do meu registo de preocupações.
Mas divago...
Dizia que, o início de ano, convida à reflexão e ponderação e, na recente época festiva, dei comigo a recordar os clubes de vídeo, essa coisa do passado não tão remoto, que proliferavam, mais ou menos ao mesmo ritmo com que agora surgem lojas de produtos biológicos.
Qualquer semelhança com os alugueres de filmes em boxes inteligentes ou a subscrição mensal de serviços de vídeo on-demand é pura coincidência e, não tivesse já esgotado o limite de caracteres que me é devido, partilharia aqui a minha opinião.
Assim, fica apenas o convite a outras reflexões. Bom ano.
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990