Editorial
Cinema | O Meu Medo
Preocupa-me o futuro a curto prazo do cinema. Do cinema de curta-metragem. Daquele que nasce da paixão, do imediato, da vontade de querer fazer custe o que custar, e sem qualquer pretensão económica.
O simples facto de querer fazer algo, e esse algo ser em formato de filme curto.
Esse cinema, ao dia de hoje, preocupa-me. Não pela sua possível extinção (isso também será um problema, mas não para ser debatido hoje, aqui, neste espaço).
O que me preocupa é a temática que o cinema curto abordará nos próximos meses, ou anos. A pandemia.
Ao longo do tempo, fui-me tornando insensível a uma série de temáticas preponderantes na sociedade. Não que não sinta a sua causa. O que eu não sinto são os filmes que a abordam.
Falo por exemplo do tema dos refugiados. Foram anos a fio com centenas e centenas de curtas-metragens a abordar essa temática. Filmes melhores, outros piores, alguns péssimos e outros, felizmente, brilhantes.
Mas o que acontece, para quem, como eu, tem de ver e ver centenas destes filmes, é que a temática se gasta em muito pouco tempo.
Ainda assim, nos últimos três anos, selecionámos quatro filmes sobre refugiados para o Leiria Film Fest.
Além da qualidade dos filmes, existe também essa responsabilidade social, que não nos pode deixar indiferentes.
Mas, com o tempo, e com o passar das centenas de filmes que vemos sobre o mesmo, a verdade, é que nos tornamos indiferentes aos filmes e às suas temáticas.
Aliás, quando os começamos a ver existe aquele pensamento de “outra vez...”.
É isso que me preocupa, sobre o que aí vem. As curtas-metragens sobre a pandemia.
Os filmes, é certo que, continuarão a ser feitos de muito amor, oportunidade, resiliência, e muita teimosia.
E será cruel, para nós espectadores ou programadores, virar-lhes a cara (ou o coração), a algo feito com todo esse esforço e, ainda mais, numa altura tão difícil.
Vai ser cruel e vai custar muito. É isso que me preocupa. É disso que tenho medo.
Artigo escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990