Opinião
CULTURA, UNIVER(CIDADE) E (DES)ENVOLVIMENTO – XXV
“O essencial é invisível aos olhos”
Quantos danos se estão a provocar no ensino superior, nas universidades e politécnicos, com a insistência nos modelos neoliberais de mão-de-obra barata que recorrem à precarização dos contratados para manter os seus cursos de pé? Que universidade e desenvolvimento queremos para o ensino superior em Portugal?
As instituições portuguesas parecem estar pouco interessadas nisso a ponto de ter de ser o próprio governo a pôr um mínimo de ordem na casa e a fazer a transição de docentes precários para a carreira mesmo que não lhes pagando, depois, o devido salário. Aconteceu, a alguns, em agosto de 2016.
E irá acontecer, de novo, a partir de outubro de 2017, também, a muitos funcionários públicos que há anos têm horários completos de trabalho e que por não haver abertura de concursos e respeito por parte de quem manda, se mantêm com contratos precários.
E que consciência é esta dos líderes das nossas instituições de ensino superior e dos seus órgãos científicos que se recusam a discutir e a apresentar estudos sobre quadros de pessoal para, não só, assegurar com tranquilidade, motivação e legitimidade a enorme quantidade de horas e unidades curriculares que estão sem professores de carreira, como, também, se envolverem na necessária investigação acreditada pela FCT? Que cultura de ensino superior é esta?
A propósito do 43.º aniversário da Universidade do Minho, um colega, Óscar Gonçalves, escreveu uma brilhante carta aberta ao seu reitor, publicada no jornal Público, de 17 de fevereiro de 2017, onde, entre outras coisas de suma importância, afirma: “a universidade portuguesa está a envelhecer.
O progresso natural deste envelhecimento é a senescência e, no limite, a morte. Gostava de lhe dizer isto, serenamente, e não ao jeito de Cassandra, para que a nossa voz chegue efetivamente a Apolo.
Ao fechar-se à renovação geracional, a universidade fez com que os que eram os mais novos há 20 anos são ainda os mais novos 20 anos passados; assim uma espécie de elixir da eterna juventude por decreto institucional. Eternizaram-se assim, complementarmente, as novas gerações com o estatuto vitalício de estudantes.
Aqueles e aquelas de que a universidade precisa para se rejuvenescer e que são já hoje, efetivamente, a sua força viva, transitam entre os diferentes graus da “carreira discente” – de licenciatura ao mestrado; do mestrado ao doutoramento; do doutoramento ao pós-doc 1; do pós-doc 1 ao pós-doc 2 etc.
Era capaz de adivinhar que alguns dos exemplos de sucesso dos quais hoje iremos ouvir falar serão obra destes e destas colegas que votámos à condição de sempiterno estudante ainda que sob interessantes designações eufemísticas”.
E o que acontece no IPLeiria, uma instituição de ensino superior ligeiramente mais jovem mas brutalmente distante, apesar de tudo, do(s) sucesso(s) da Universidade do Minho?
Sabem que o presidente do IPL tem na gaveta concursos para a entrada na carreira, em áreas fundamentais da ESECS, desde 3 de Agosto de 2016? Será que teria coragem de o fazer se fosse de outra escola do IPL? A ESTG, por exemplo, admitiria isto? E nós, professores do IPL, que fazemos? Somos coniventes com isto?
Em 2015 foram cabimentados para a ESECS 5 lugares para Professor Adjunto. Em 2016 foram cabimentados 7. Sabem quantos concursos foram abertos em 2016? Zero! E entre 2009 e 2017 apenas foram abertos 5 lugares para o início da carreira. Sabem quantos professores o IPL tem contratados precariamente só na ESECS? Muitas dezenas. Que ensino superior é este? Que respeito é este pelos colaboradores? Que instituição inclusiva é esta?
Termino, hoje, retomando Óscar Goncalves: "Paradoxalmente, são estes precários o espectro visível a que hoje recorremos, não só para assegurar a sobrevivência dos nossos projetos investigação, ensino e interface, mas também para ilustrarmos o nosso sucesso e ascendermos ao Olimpo dos rankings académicos. Em troca, para estes nossos colegas uma mão cheia de coisa nenhuma. Estas pessoas têm cara e rosto". (Público de 17 de fevereiro de 2017).
Não contem com o meu Ámen para estas práticas insanas. Sou cidadão!
*Professor Decano do Instituto Politécnico de Leiria
Professor Coordenador Principal
ESECS-IPLeiria e CICS.NOVA.IPLeiria
(O autor deste texto escreve segundo as regras do "Acordo" Ortográfico de 1990)