Editorial

Debate par(a)lamentar

20 fev 2025 08:05

Os exageros a que assistimos, na semana passada, levantam sérias interrogações sobre o decoro parlamentar e a saúde do nosso sistema democrático 

O mais recente episódio de insultos entre deputados na Assembleia da República tem gerado um debate acalorado sobre os limites da liberdade de expressão e as suas implicações para a democracia.

Quem está habituado a assistir aos debates parlamentares, ou a ler as actas desses mesmos debates, já se familiarizou com os apartes dos eleitos, sejam eles da ala mais à direita ou da ala mais à esquerda do quadrante político. Mas, desta vez, parecem ter sido ultrapassadas as regras mais elementares do bom-senso e da boa educação.

Eleitos para um órgão que tem como nobre missão o poder de legislar e fiscalizar a actuação do Governo, os deputados à Assembleia da República, têm, acima de tudo, a responsabilidade de representar a população que os elegeu. Devem, por isso, ser exemplos de comportamento ético e de pugnar pela integridade da instituição parlamentar.

Os exageros a que assistimos na semana passada, além de reflectirem a crescente polarização política, levantam sérias interrogações sobre o decoro parlamentar e a saúde do nosso sistema democrático. É verdade que a democracia só se fortalece com a diversidade de opiniões. Mas será que para se exercer esse direito é necessário recorrer à demagogia, ao bullying e à mentira?

Martin Jay, autor de um livro sobre o uso da narrativa competitiva e da mentira na política, admite que sim, ao afirmar num dos seus escritos, que “a política, afinal de contas, é um empreendimento tão antagónico quanto colaborativo, onde o que está em jogo justifica praticamente todos os meios para se alcançar a vitória”.

Segundo o investigador norte-americano, “mais do que intrinsecamente imoral, ela [a política] é um espaço onde se entrechocam moralidades e interesses em competição, de tal forma que abre uma clivagem entre valores nobres e as tácticas impiedosas usadas para os defender”.

Esperançosamente, Martin Jay também lembra que “a crença numa mentira depende, em grande parte pelo menos, da credibilidade da sua asserção e da confiança, mesmo que equivocada, na honestidade de quem a enuncia”.