Opinião

Direito à Vida?

16 jul 2022 09:00

Meu caro Zé, Nem sabes o que por cá vai!

A guerra na Ucrânia continua, mas como já se tornou “trivial” tende a ser esquecida, passando das aberturas e longas reportagens nos telejornais para o seu interior, tal como acontece com a imprensa, havendo mesmo dias em que, nas primeiras páginas, nem sequer há remissão do assunto para páginas interiores.

A aceleração do tempo, a lógica cada vez mais prevalecente do curto prazo, com a permanente necessidade de “novidade”, atirou para a ribalta, para além da demissão de Boris Johnson, o assassinato de Shinzo Abe, no pacificado Japão, substituindo a discussão do Supremo Tribunal dos EUA sobre o direito ao aborto, revogando o direito da mulher ao aborto, determinando que cada estado federado pode decidir por conta própria nesta matéria. Em tudo isto, guerra na Ucrânia, decisão do Supremo Tribunal e assassinato de Shinzo Abe, está em causa o direito à vida.

E a primeira pergunta que me ocorre é se é legítimo haver discriminação no direito à vida, sendo certo que, em bom rigor, só se discrimina quando se trata diferentemente situações similares.

Dir-se-á, então, que nestes três casos que cito não faz sentido falar de discriminação, embora esteja em causa sempre a vida. Mas, então, o direito à vida é um direito humano fundamental ou fica condicionado pela situação em causa?

Curiosamente, poderemos reconhecer que a abolição da pena de morte seria, implicitamente, o reconhecimento do direito à vida.

Mas, como vemos, para além de essa abolição estar longe de ser universal, há assassinatos e mortes em guerra, incluindo de civis indefesos, já não falando do caso ainda mais complexo dos “bombistas suicidas”. Este caso implica a simultaneidade de “matar” e “morrer”, levantando o problema do direito a tirar a vida com o direito a dar a sua própria vida. E este último caso levanta ainda a avaliação das condições em que é o próprio que abdica do seu próprio direito, havendo condições muito diferenciadas que estarão na base dessa abdicação, particularmente se se entender que a cada direito corresponde uma responsabilidade.

Caro Zé, estarás a pensar, e muito bem, que eu só estou a levantar problemas, sem responder às perguntas, e tens razão. Só que o faço propositadamente para procurar mostrar que é um assunto tremendamente difícil de discernir, não sendo aceitável a ligeireza com que, por sistema, se assumem posições extremas sem qualquer pensamento amadurecido e comprometido.

O caso do aborto é paradigmático: como se passa de um crime a um direito?

Fica para a próxima. Até sempre