Opinião
Letras | # gramática da fantasia: numa casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão
Onde não se aceitam os outros como eles são, não me parece que bata um bom coração
É, e onde não há relação e amor e respeito também… E onde não há artes e música e livros e poesia também não acredito que haja alegria. E onde não há amigos, partilha e entreajuda... entro calada e saio muda... E onde não se aceitam os outros como eles são, não me parece que bata um bom coração.
Estas rimas podem dar o tom para a minha partilha desta semana e em que cada uma delas daria pano para mangas, já que estou em modo ditados populares.
A EAPN - Rede Europeia Anti Pobreza celebra de 3 a 14 de Abril, a interculturalidade numa parceria com várias instituições da comunidade. O núcleo distrital de Leiria associa-se a outras tantas parcerias e eu fico feliz por de forma singela fazer parte a nível pessoal e profissional.
Hoje apetece-me falar-vos do projeto Há Pão Para Tod@s, levado a cabo pela EAPN de Leiria em articulação com a União de Freguesias de Marrazes e Barosa, e que resultou num belíssimo documentário.
Integrando a Semana Pelo Combate à Pobreza e Exclusão Social de 2022, e a pretexto da confecção do pão, da simbologia da partilha e da ética do cuidado, com o bem estar do outro, proposta por Tomé Dionísio, artista, performer, ativista e filósofo, que quis cuidar da sua comunidade e certificar-se que perto de si e dos seus não faltaria o pão, a criativa Catarina Dias e a generosa Patrícia Grilo, da União de Freguesias de Marrazes e Barosa e EAPN Leiria, respetivamente propuseram a extensão da iniciativa aos concelhos de Leiria, Ansião, Pombal e Alcobaça e envolveram famílias, escolas e comunidade num projeto de partilha de receitas, sorrisos e vontades, ingredientes que a várias mãos amassaram o pão que chegou para si e para outros, multiplicando-se a vontade de não deixar ninguém de fora.
Esta iniciativa foi recentemente apresentada em jeito de documentário pela mão de Luís Melo da Musaiko e eu, e o Diogo e a Sandrina tivemos a sorte de o partillhar também com alunos no AE Marrazes e de recebermos pessoas da comunidade trazidas pela Ana Prates (CLDS Aqui D’EL Rei) e a Patrícia Grilo e a Catarina Dias, para o vermos todos junt@s, numa tarde em que cada um partilhou também as suas memórias, as suas diferenças, os seus medos e ambições.
No dia seguinte as pessoas da comunidade ensinaram miúdos e graúdos a ir à lenha, a amassar o pão e a cozê-lo num forno comunitário no Parque de Merendas da Barosa. Houve lanche pão quente com manteiga, música, tradição e contemporaneidade. Houve tempo a correr lento e mãos enfarinhadas e muitas gargalhadas. Houve interculturalidade, intergeracionalidade e intercomunidade. Algumas daquelas coisas que derrubam fronteiras e que o dinheiro não paga.
Calvino dizia qualquer coisa sobre as atividades que parecem absolutamente gratuitas e não essenciais que recupero de Ordine: “Muitas vezes o empenho que os homens dedicam a atividades que parecem ser absolutamente gratuitas, sem outro objetivo a não ser o divertimento ou a satisfação de um problema difícil, revela-se essencial num âmbito que ninguém previra com consequências que vão longe”.
Houve pão para tod@s! E haverá sempre... assim haja razão e vontade...