Opinião
Maioria Absoluta?
Não ponho em causa que o parlamento representa, formalmente, o conjunto de votantes. Pergunto-me se ele representa o povo
Meu caro Zé,
Lembrar-te-ás que, há pouco tempo atrás, te referi que tinha as maiores dúvidas sobre o funcionamento verdadeiramente democrático das maiorias absolutas. Antes de continuar, quero deixar explícito, porque nessa altura não ficou, que o que está em causa não é tanto a maioria absoluta de uma coligação formalmente estabelecida, como é o caso presente na Alemanha, mas da maioria absoluta de um só partido.
Voltarei já às razões que me levam a retomar o assunto, mas entendo que há que, em primeiro lugar, olhar para a frieza dos números para avaliar o que é, verdadeiramente, a maioria absoluta que nos (des)governa.
Nas últimas eleições o PS obteve 41,37% dos votos, tendo votado 51,42% dos quase 11(!) milhões de inscritos, o que significa que votaram no PS apenas 21,2% dos inscritos, ou seja, cerca de 1 em cada 5.
O número de inscritos está claramente exagerado (mais uma falta de cuidado com as necessidades de uma verdadeira democracia representativa) e, apenas para uma tentativa de aproximação à realidade, admitamos que 20% dos inscritos já não deviam estar nos cadernos eleitorais, ou por falecimento, ou por falta de condições para votar.
Isso faria passar os 21,2% para cerca de 26,5%, ou seja, cerca de 1 em cada 4. Mas mais, os tais 41,37%, em termos proporcionais, representariam 95 dos 230 deputados e o PS, graças ao método de Hondt e à dispersão de votos, conseguiu 120 deputados, ou seja, mais 26,3% do que teria numa representação proporcional.
Dirão, para os primeiros números, que quem não vota, não conta e, para os segundos números, que está tudo de acordo com a Constituição e ambos os argumentos estão certo. O que me preocupa então?
Não ponho em causa que o parlamento representa, formalmente, o conjunto de votantes. Pergunto-me se ele representa o povo, aquele que decide não votar porque desacredita do poder do seu voto, e se as minorias que se manifestaram estão adequadamente representadas no parlamento.
Por outras palavras, se esta estrutura formal existente não está a “matar” uma democracia verdadeiramente representativa, abrindo, cada vez mais, a porta aos extremismos.
E, por fim, a razão última do meu regresso ao tema: perante as últimas posições do Presidente da República face ao Governo, o Presidente da Assembleia da República afirmou que é a essa Assembleia que compete vigiar o Governo. Como? Com uma maioria do partido do Governo, composta por deputados que não foram eleitos nominalmente, seguindo os ditames de quem, verdadeiramente, os “elegeu”?
Todos temos visto que esse controlo por parte do Grupo Parlamentar não tem existido, com uma manifesta promiscuidade entre ele e o Governo e a falta de abertura deste a quem não tem o “cartão” e daquele às propostas da oposição. O Estado é o PS!
Já agora, o Presidente da República é eleito nominalmente pelos votantes. Até sempre,