Opinião
Meritocracia
A obsessão pelo risco zero da vida roubou-nos a dignidade
As narrativas dominantes do medo levaram-nos a todos os dias repetir palavras que quase rimam com distanciamento.
Tal como numa novela distópica, a obsessão pelo risco zero da vida roubou-nos a dignidade, a liberdade e agora está a dar uma sova na esperança.
Escavou um abismo entre nós que, e só talvez, as próximas gerações terão a oportunidade de cobrir com uma ponte, se lhe deixarmos os materiais.
A desinformação é tal que em vez de polarizar a sociedade, a fragmentou em mil pedaços, matando a empatia e promovendo a inimigos pessoas que ainda há pouco se davam bem.
Desde a classe política aos médicos instagramáveis e aos famosos especialistas, todos têm falhado à excepção de uma coisa: confundir os “civis” que, pelo menos em Portugal, têm mansa e construtivamente aceite todas as boas e más resoluções, porque assim somos e seremos.
Tal como antes de Copérnico, as pessoas não sentindo a Terra a girar e observando apenas o Sol a levantar-se e a pôr-se, julgavam que era ele que girava à nossa volta; o aumento de casos, as variantes, o apocalipse, estão cada vez mais difíceis de digerir, tanto que as mortes diminuíram, as hospitalizações idem, e não se vêem zombies a cuspir gosma pela boca na rua.
Mesmo assim, não se desaperta o laço da garganta nem se alivia o caos que é coisa garantida.
Muitos dos portugueses até andam a mudar o chip (mas cuidado que a Dr.ª Graça Freitas está à espreita com a zaragatoa), e saem às ruas para viver, essa coisa horrível, com ou sem Covid, antecipando aquilo que acontecerá (assim a DGS o permita), que é convivermos com coisas que nos podem matar, como os automóveis, a poluição, o tabaco, o cancro, as drogas.
A meras semanas de outra eleição com a probabilidade do PS continuar a governar, muita gente anda a escrever ou a dizer: “temos o que merecemos.”
Pergunto eu : o que fizemos para merecer isto?