Opinião
Metro de Leiria a Fátima
Todas as discussões sobre transportes em rede e interoperáveis, por aqui são só ideias
Nas minhas últimas férias de Verão tive a felicidade de realizar um dos meus sonhos, de visitar a Turquia (país de bons amigos e para onde correm hoje as minhas preces).
Numa das passagens por vários sítios, tinha assinalado o mítico restaurante e ponto de partida do Expresso Oriente. O comboio que inspirou gerações, eternizado no livro de Agatha Christie, com Poirot a embarcar em Istambul até Paris.
Hoje é a parte antiga da estação de Istambul, onde tudo inspira ao livro e a filmes. Essa zona convive linhas meias com a novíssima frequência de comboios e metro, em horários altamente eficientes e que, daquele ponto, nos levam do oriente ao ocidente que exibe a cidade.
Tudo ali é serviço ao cliente. Melhor, só conheci em Helsínquia. Qualquer comparação com a realidade portuguesa é uma miragem. E não é só uma questão de escala, é de tudo o resto, sempre com as pessoas em primeiro lugar. Nada é ao acaso, desde a posição das escadas ou das portas de acesso e máquinas de compra de ingressos, tudo é feito a pensar no que um passageiro precisa, de forma intuitiva.
Falava no meu último artigo, desta região contínua entre Leiria e Fátima, onde se organiza a vida de milhares de pessoas, famílias, empresas de forma “natural”. O serviço de mobilidade entre estas realidades é fraco, rodoviário e individual. É uma região deficientemente servida de transporte coletivo (seja lá ele público ou privado), e onde a ferrovia não atingiu o século XXI, ficou-se nos livros vintage que citei.
Todas as discussões sobre transportes em rede e interoperáveis, por aqui são só ideias. Serviços ferroviários são de fraco nível para as necessidades do ano 2023 numa Europa que se quer moderna, daqui a Istambul. A recente proposta de Plano Ferroviário Nacional tem uma evidente litoralização de serviço (não se coloca um “bicho” de ferro como é um comboio, para andar vazio, certo) mas esquece este pontinho de ligação que é o eixo Leiria a Fátima.
Falar sobre ferrovia pesada não é a mesma coisa que achar que se constroem mais ou menos km de estrada, com uma linearidade típica do século passado.
Daí que a proposta apresentada pela câmara de Ourém seja de indiscutível actualidade no contexto desta revisão. Escala o conceito tradicional regional de mau serviço ferroviário pesado (entre pontos desconexos e com más ligações), e aposta numa ligação por via dum sistema de ferrovia ligeira, o chamado metro de superfície, entre a futura estação de Alta Velocidade em Leiria, servindo também a cidade, com ligação ao centro de Fátima.
O metro de superfície aparece como solução versátil e moderna, como já acontece em soluções semelhantes no País, pegando nestas duas realidades e dando-lhe serviço em rede. O estado central não pode existir só para alguns, e aqui faz falta.
Está encontrada uma solução para a região baseada no serviço ao passageiro, seja ele cidadão local, turista, peregrino ou ocasional. Servir a vida real e actual das pessoas, de forma eficiente, como se faz em todo o mundo, deveria inspirar-nos a ambicionar escrever uma história melhor para nós. De Leira a Fátima, como de Paris a Istambul. Eu acredito.