Opinião
Música | Estro / Watts – Poesia da Idade do Rock
Não é fácil classificar este projeto, mas talvez possamos dizer que anda ali entre a instalação sonora, o teatro, o concerto e a spoken word
Por estes dias passou por Leiria, mais precisamente no Teatro José Lúcio da Silva, o espetáculo Estro/Watts - Poesia da Idade do Rock, inserido na programação do Festival Ronda Poética. Não é fácil classificar este projeto, mas talvez possamos dizer que anda ali entre a instalação sonora, o teatro, o concerto e a spoken word. Os próprios autores, o encenador Gonçalo Amorim e o músico Paulo Furtado, também têm dúvidas: falam em algo operático, algo que mistura diversas artes. Deve ser isso.
A partir de textos de João de Menezes-Ferreira, a Poesia da Idade do Rock apresentou um conjunto de canções escritas entre 1957 e 1980, traduzidas para português e ditas, ou cantadas, pelos atores Ana Brandão, Diana Narciso, Hugo Inácio, Iris Cayatte, Pedro Almendra, Pedro Galiza e Susie Filipe, do Teatro Experimental do Porto.
Entre canções épicas e famosas, como “Walk on the Wild Side”, de Lou Reed ou “Get Up, Stand Up”, de Bob Marley, ou outras menos óbvias como “Killing na Arab”, de Robert Smith, ou “Future Legend”, de David Bowie, o público foi desafiado a identificar as canções, uma vez que as letras em português não são bem a mesma coisa – e se foi mais ou menos fácil acertar em “São quatro da manhã e dezembro está a acabar”, como sendo o início de “Famous Blue Raincoat”, de Leonard Cohen, com outras só lá cheguei com a ajuda da minha amiga do lado, que me ia sussurrando ao ouvido qual era a canção.
Neste espetáculo, dá-se o devido destaque à palavra da idade do rock, letras que marcaram uma época, às quais foi adicionada uma boa dose de eletricidade por músicos míticos, como Frank Zappa, Joey Ramone, Janis Joplin, entre muitos outros.
A palavra no rock tem o seu lugar na história. Não é só aquele riff, fuzz ou pedal em distorção, as palavras de Bob Dylan podem levar ao Nobel da Literatura, mas as palavras de Johnny Rotten podem desencadear um motim.
Em Estro / Watts encontramos um espetáculo visualmente muito atrativo, com Paulo Furtado a contar com a preciosa colaboração do leiriense Filipe Rocha, que toca vários instrumentos, mostrando que é um músico multifacetado e de uma qualidade irrepreensível.
À conta disto, andei uns dias a revisitar Bob Dylan e a prestar mais atenção às suas palavras - No dia 4 de junho, o artista vai estar em Lisboa e estou muito tentado em ir ouvir o que este senhor tem para dizer. Se for, depois conto.