Opinião
Música | Libertando os fantasmas à boleia de Haslinger
Haslinger parte da premissa de uma necessidade urgente de escape da turbulência emocional que toda esta situação pandémica nos trouxe
Há sempre aqueles músicos e compositores de craveira mundial que conseguem que as suas criações sejam apetecíveis nos mais variados meios audiovisuais. É o caso do austríaco Paul Haslinger.
Um dos muitos membros que passou pela famosa banda alemã de música electrónica/rock progressivo Tangerine Dream (que, aliás, foi também responsável por dezenas de bandas sonoras para filmes), o agora residente e trabalhando a partir da agitada cidade de Los Angeles (desde inícios dos anos 90), Haslinger é já responsável por uma lista infindável de bandas sonoras quer para filmes (sendo o franchising Underworld o mais notório), quer para videojogos (incluindo uma colaboração com o talentoso Ben Frost num recente update do Rainbow Six series, datado de 2018, parece-me).
A par de tudo isto, Harlinger tem ainda vários álbuns a solo, sendo o último “Exit Ghost II” ainda deste ano de 2021 e que surge na sequência de “Exit Ghost” lançado o ano passado.
Neste último trabalho discográfico, Haslinger parte da premissa de uma necessidade urgente de escape da turbulência emocional que toda esta situação pandémica nos trouxe, uma tentativa (provavelmente, algo infrutífera) de vencer aquilo que considera um valente trauma, com maior ou menor extensão dependendo do indivíduo, que nos foi tragicamente infligido.
“Exit Ghost II” pretende, ainda, servir de contraponto (não no sentido musical) ao álbum que o antecede, num aparente fechar de ciclo onde o registo mais introspectivo e algo melancólico é agora como que complementado por uma energia mais efervescente e contagiante.
Como li algures enquanto procurava alguma informação sobre o autor, este disco ostenta a metáfora de uma chegada triunfal a terra depois de um período dramático à deriva.
O álbum foi lançado em Junho passado por uma editora do Reino Unido, a Artificial Instinct. Bem curioso este facto sobre Haslinger: em Novembro de 2009, fora contratado para compor a banda sonora para “The Wolfman”, substituindo Danny Elfman; no entanto, o estúdio que produziu o filme acabou por mudar de ideias e, depois de completados os temas, substituiu essa mesma banda sonora pelo que havia já sido composto por Elfman, e isto apenas a um mês da estreia.
O estúdio considerara que a abordagem electrónica e muito à base de texturas não seria a mais indicada. Não terá sido fácil para Haslinger aceitar este volte-face, imagino. “Exit Ghost II” congrega alguns dos melhores traços identitários do compositor, exaltando o valor da melodia, enquanto fascínio pelo belo e o memorável (trazida pelo seu piano), enquanto nos envolve em longos movimentos de uma aparente sobriedade electrónica, embora essencial para nos trazer aquela intensa contemporaneidade fortemente cinematográfica que nos agarra desde o primeiro momento.
Que este trabalho sirva de humilde inspiração para renovarmos a crença de que estaremos a poucos passos de vencer este vírus.