Opinião

Música | Ruído, pouca cor e saturação que forçam vida na sua aparente falta dela

10 jul 2020 20:00

O Peru, fascinante país berço dos antigos Incas e onde se vive em feliz harmonia com a natureza, não obstante, a sua geografia algo agreste, viu nascer o jovem compositor Sergio Díaz de Rojas em 1994.

Compositor ainda jovem, há já vários anos que reside e trabalha a partir de Valência, Espanha.

A sua música é ainda profundamente desconhecida do grande público e são ainda escassos os registos que dela fez.

Vislumbra-se, todavia, uma forte e promissória propensão para a criação artística tais são as conquistas significativas que obteve em tão curto espaço de tempo, como por exemplo a recente inclusão de uma das suas peças na compilação intitulada Project XII, com curadoria da alemã Deutsche Grammophon.

Piano é o seu instrumento e tende a ser em formações intimistas de música de câmara que se expressa na sua vertente de compositor.

É verdade que tem conseguido que o seu trabalho chegue a alguns palcos e despertado o interesse de algumas editoras, mas também é evidente que está naquela posição algo periclitante de autor emergente tais são as arestas que ainda terá de limar com busca a uma afirmação no sempre mais vasto universo da música dita clássico-contemporânea.

Falo-vos hoje de Unsaid Words, o disco de estreia de Sergio, auto-editado em 2015. Há toda uma preocupação do músico em atribuir uma consistência estética e de narrativa neste seu álbum, que incluiu a produção de quatro videoclipes e oito ilustrações de Flora Cecilia (que se podem descobrir com toda a calma na página pessoal do autor: bonjoursergio.com).

Sergio foi algo arrojado neste ímpeto de partilhar o seu trabalho pois nele verteu precisamente as suas primeiras criações, seis para solo piano e duas para piano e violoncelo.

Em jeito de interlúdios não musicais, mas altamente sugestivos e introspectivos, Sergio gravou a sua voz a ler poesia luminosa de Falon Blanchard.

O álbum torna-se assim uma espécie de narração do seu quotidiano numa clara tentativa de nos envolver nas suas já por si melancólicas e muito imagéticas composições.

Sinto que a nível de produção (captação, mistura e masterização), Unsaid Words poderá estar um pouco aquém das actuais ambições do autor, consequência algo previsível da eventual imaturidade de um primeiro trabalho.

Não deixando de ser também curioso que tal possa jogar a favor da audição do mesmo por “forçar” o sentimento de nostalgia e pertença, como acontece com o fascínio pelas fotografias antigas, que com ruído, pouca cor e saturação forçam vida na sua aparente falta dela.

É um disco de memórias, tocadas e faladas, muito minimalista e tranquilizante, onde Sergio nos conta claramente uma história e que muito possivelmente está ligada às suas raízes familiares peruanas e o saudosismo que daí advém.

Um autor a acompanhar.