Editorial
Percepção ou realidade?
O sentimento de insegurança, pelos vistos, não se mede por estatísticas oficiais. Cria-se nas ruas, nas conversas de café, nas redes sociais
O confronto entre percepção e realidade tem estado ao rubro nos últimos meses, a propósito do “sentimento de insegurança” dos portugueses, associado abertamente por algumas vozes com (ir)responsabilidade política, ao aumento do número de imigrantes em território nacional. As autoridades já vieram a público apresentar dados, quer do número de crimes, quer do número de estrangeiros em reclusão presidiária, para demonstrar que Portugal continua a ser “um dos países mais seguros do mundo”.
Mas o sentimento, neste caso de insegurança, pelos vistos, não se mede por estatísticas oficiais. Cria-se nas ruas, nas conversas de café, nas redes sociais, nos soundbites populistas.
Esta semana foi divulgado o Índice de Percepção da Corrupção 2024, que coloca o nosso País na 43.ª posição, a pior de sempre desde que é compilada esta estatística, em 180 países. Para a elaboração deste relatório, a Transparency International baseia-se na percepção de um conjunto de especialistas, que avaliam regularmente aspectos como a eficácia das instituições, a independência da justiça e a aplicação das leis anti-corrupção.
No caso de Portugal, a queda de nove lugares na tabela em relação ao ano anterior, deveu-se sobretudo à percepção “de abuso de cargos públicos para benefícios privados e por fragilidades nos mecanismos de integridade pública para evitar esse abuso”. Se esta percepção fosse medida junto da opinião pública, os resultados poderiam revelar-se ainda mais preocupantes.
Senão, vejamos: no último Barómetro Global da Corrupção, tornado público em 2021, e realizado pela mesma organização com base em entrevistas a 40 mil cidadãos da União Europeia, 60% dos portugueses inquiridos disseram que o Governo estava a falhar no combate à corrupção, 41% admitiram que a corrupção tinha subido no último ano, 63% acreditavam que o Governo sofria influências indevidas de pessoas com grande poder político ou económico e 88% achavam que havia corrupção entre o Governo.