Opinião
Que a eficácia do “romantismo” se escancare na vida, digo eu!
Acredito na eficácia dos professores “românticos” na formação de cidadãos competentes para a vida
Gosto de desafios, sempre gostei, e foi isso que me salvou quando, já com anos de frustração por ter sido impedida de no liceu escolher a alínea H, dei comigo triste a encarar, no estágio profissional, uma turma de crianças.
A minha escola de então, a Silva Gaio em Coimbra, recebia muitos rapazes e raparigas de famílias pobres da “baixinha” da cidade e também muitos outros e outras de famílias com poder económico para verem, das janelas e jardins das suas casas, erguidas na encosta do lado de lá do Mondego, a encantadora Coimbra.
Cedo percebi que era a todas essas crianças, marcadas já por vidas tão diferentes, que eu iria ajudar a serem alunos para que depois pudessem gostar de aprender comigo e entre si, ciências ou matemática.
E foi, por isso, que também cedo entendi a enorme complexidade do desafio que tinha pela frente!
Mas afinal, dei comigo a entrar numa apaixonante aprendizagem e a concluir que ser professora era estar permanentemente implicada em atos de criação!
Era quase como se cada aluno fosse uma tela capaz de se pintar a si própria e que se me dava a conhecer já rabiscada.
Já eu, via-me como se o meu trabalho fosse o de um cavalete sempre à procura do equilíbrio necessário para que cada um sentisse a sua tela estável e convidativa a fazer nascer dos rabiscos sólidos e belos esboços coloridos.
Esboços aptos a serem transformados, no futuro, em autênticas obras de arte expostas pelos seus autores: nas suas casas; nos seus locais de trabalho; nas suas comunidades; no Mundo!
E é assim, em modo “cavalete”, que quando estou como professora com uma criança ainda hoje me sinto.
Sei que muitos me apelidam de romântica, mas não me importo!
Para que alunos gostem de aprender e para tal se esforcem também os professores devem aprender: a submeterem o ensino que preparam às necessidades de aprendizagem de cada discente; a usarem metodologias de trabalho com as quais os alunos se sintam a ter um papel mais ativo nas suas aprendizagens; a sentir-se livres para, quando necessário, moldar e tornar flexível a rigidez dos respetivos programas.
E é por ser assim “romântica” que, apesar de me agradarem as chamadas “Ideias Inovadoras do Currículo” enunciadas no documento “Aprendizagens Essenciais de Matemática para o Ensino Secundário”, eu desconfio da sua boa implementação.
É que, para que estas aprendizagens sejam efetuadas com sucesso, as metodologias propostas (opostas às metodologias tradicionais e muito usadas pelos professores “românticos”) destinam-se a apetrechar com reais e úteis recursos matemáticos o cidadão comum, mas parece desconhecer-se o facto de tal vir a ser desenvolvido numa escola tradicional que só pode usar metodologias tradicionais pois se sente quase, exclusivamente, a preparar alunos para o prosseguimento de estudos no ensino superior.
Perante esta incongruência, porque acredito na eficácia dos professores “românticos” na formação de cidadãos competentes para a vida, porque gosto do atual ministro da educação, mas também de desafios, deixo-lhe um: acabar com a relação direta entre os exames do ensino secundário e o acesso ao ensino superior, deixar que a eficácia do “romantismo escolar” se desenvolva ao longo da escolaridade obrigatória e depois, depois se escancare na vida!
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990