Opinião
Tu estás bem e eu?
Mais do que nunca, é imperativo que saibamos clarificar o que é (ir)relevante no acto de conhecer
A propósito do persistente questionamento sobre o sentido da vida, facilmente intuímos que o ser humano é o espelho e o resumo de tudo quanto vive e decanta no universo, pelo filtro da (in)consciência. Devemos aos filósofos a premissa de que há um diálogo racional para a procura do sentido da existência, uma verdade oculta por detrás do véu das aparências.
O reportório intelectual não é estéril. Desvelamos o que somos, na convergência entre o caminho da vida e os segredos da alma. É um importante alerta para cada um de nós, que vamos acolhendo de diversas fontes a indução para o nosso rumo, inúmera informação que redunda em “desinformação”, convertida em mistificação da verdade (e subsequente falsidade), instalando-nos num enredo cada vez mais globalizado, condicionado pela “inteligência” algorítmica.
Mais do que nunca, é imperativo que saibamos clarificar o que é (ir)relevante no acto de conhecer. Talvez possamos celebrar equívocos, mas não será possível o Homem desejar distinguir-se do seu semelhante? “Sentir é compreender. Pensar é errar. Compreender o que outra pessoa pensa é discordar dela. Compreender o que outra pessoa sente é ser ela”, (in Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Fernando Pessoa: Ática, 1966. 216).
Não somos assediados pela consciência enquanto entidade psicológica, mas sim, pela consciência de ser. Nessa medida, somos guiados por uma (des)ilusão permanente, dado que a consciência não nos conduz ao destino, pois ela é a maior virtude da inconsciência. “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo”, inscrição cunhada no Templo de Delfos, atribuída a Sócrates, Tales de Mileto ou a Pitágoras, é um permanente apelo à arte de conhecer o nosso “templo da alma”.
Implicitamente, a inscrição invoca a memória do passado fixando-nos no presente. Mas também encarando o futuro. E sugere que os deuses, pejados de características humanas, admitem os seus defeitos e a existência de uma linha (i)moral em que todos nos movemos, tornando-nos nessa espécie de ‘caçadoresrecolectores’ de quimeras e desejos.
A virtude do aforismo é essa: a do enigma, expressão virtuosa do humanismo, que nos posiciona entre o caos da ambição e a constatação da realidade. Saibamos perscrutar o que nos oferece a vida, tal como José Mattoso, nos legou: poderemos responder a uma parte restrita das oportunidades que ela nos oferece – Ser e Deus são a mesma entidade, aquilo que Caeiro apelidava de «espantosa realidade das coisas».