Editorial
Ultrapassar as diferenças com a partilha
Nós, portugueses, sabemos bem, por experiência própria, o que é a emigração
Para início de reflexão, uma pergunta: há quanto tempo começou a ouvir falar na necessidade de acolhimento de refugiados?
Talvez depois das investidas norte-americanas contra os talibã, no Afeganistão, da chamada Primavera Árabe, da eterna guerra na Síria, e dos confrontos étnicos em vários países africanos, alguns dos conflitos que contribuíram para mudar o paradigma dos fluxos migratórios nos últimos anos.
Nós, portugueses, sabemos bem, por experiência própria, o que é a emigração.
Quantos dos nossos antepassados não deixaram as famílias e partiram à procura de uma vida melhor, sobretudo na última metade do século passado?
Agora, a situação inverteu-se. A quantidade de emigrantes desceu para os números mais baixos dos últimos 20 anos, mas a percentagem de estrangeiros a viver no nosso País continua a registar subidas, ano após ano.
Os dados mais recentes do Censos 2021 mostram que o número de estrangeiros a residir no distrito de Leiria representa já cerca de 10% da população total.
Ou seja, uma percentagem que quase duplica os valores registados a nível nacional. Só o concelho da Marinha Grande, por exemplo, registou um aumento de imigrantes na ordem dos 45% e acolhe neste momento 4.222 residentes de outras nacionalidades que não a portuguesa.
E as associações de apoio aos imigrantes desconfiam que estes números estão avaliados “por baixo”.
A origem de muitos destes imigrantes, de acordo com informação disponibilizada pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), abrange mais de 80 nacionalidades.
Com a particularidade de algumas delas corresponderem a pessoas que deixaram o seu país não apenas em busca de um futuro mais risonho, mas também para fugirem da guerra, da perseguição e até dos efeitos provocados pelas alterações climáticas, o que lhes confere o estatuto de refugiado.
Chegados aqui, impõe-se outra pergunta: estaremos nós (e este nós é transversal a todos os sectores da sociedade) preparados para lidar com o impacto desta globalização da mobilidade, que exige novos modelos de integração?
A avaliar pela fragmentação ideológica que pulula por boa parte das conversas de café, das tertúlias de amigos, das mensagens nas redes sociais, e até de alguns discursos políticos mais populistas, diríamos que não.
Mas por outro lado, exemplos como o do Ninho, que retratamos nesta edição, fazem-nos acreditar que é possível ultrapassar as diferenças culturais, substituindo as diferenças por laços de fraternidade e de partilha.
Um Feliz Natal.