Opinião

Viva a Ucrânia! Destrua-se o monstro!

5 mar 2022 15:45

Alguns dizem que contar às crianças histórias de monstros pode ajudá-las a enfrentarem os seus medos

Para tentar perceber um pouco melhor a “dissecação” que Jean-Paul Sartre diz ter querido fazer a Flaubert com o seu O Idiota da Família, pus-me a ler, de Julian Barnes, o livro O papagaio de Flaubert.

E como, aliás, eu já esperava, ainda continuo às voltas com essa leitura! É que, página sim, página não, há referências a lugares, factos ou considerações, que devido à minha enorme ignorância literária me sinto, antes de passar à página seguinte, obrigada a esclarecer.

Só desta maneira, isto é, atribuindo um significado ao que leio, me acho a fazer uma leitura compreensiva do que o autor me quer comunicar e apenas assim, e só assim, dou comigo a retirar um prazer imenso da leitura.

Lembro-me de que esta minha forma de ler me deu muito jeito quando queria interessar alunos na aprendizagem de conteúdos disciplinares e tenho até para mim que um dos problemas do insucesso na aprendizagem da matemática está ligado à pouca importância que nas aulas se atribui à teoria, enquanto se sobrevaloriza a prática.

Mas, e voltando à leitura do Papagaio de Flaubert, todo o trabalho que ela me está a dar já valeu a pena. Recordou-me a necessidade de me manter humilde perante o que os outros sabem e eu não e de me dispor, antes de os julgar pelo que dizem, a observar o que fazem e só depois os criticar ou elogiar.

Entretanto chegou-me, como oferta de uma pessoa que me é muito querida, um outro livro: de Anabela Mota Ribeiro, Os Filhos da Madrugada.

Claro que me foi impossível não iniciar a sua leitura e apesar de esta se ter mostrado bem mais fácil do que a do Papagaio também ela, desde logo, me ensinou algo.

Fez-me recordar que as antipatias que por vezes sentimos por algumas pessoas, neste meu caso por uma mulher militante de um partido da direita democrática que é uma das entrevistadas nesse livro, se esbatem quando ficamos a conhecer melhor os contextos e circunstâncias das suas vidas.

Ora, estava eu neste clima, a sentir reforçadas as minhas capacidades para ser uma agente da paz e eis que Putin manda as suas tropas invadir a Ucrânia!

Sem cabeça para continuar com as minhas leituras prazerosas, desde então só tenho procurado informar-me e ler tudo o que encontro sobre as histórias da Rússia e da Ucrânia e também sobre a vida de Putin.

Concluí que não fosse Putin a pessoa que é, uma “produção animal contrária à ordem regular da natureza” - um monstro - e russos e ucranianos bem podiam sentir-se povos irmãos!

Mas não! A sentirem tanta dor e a assistirem a tanto sofrimento como poderão as crianças de ambas as nações crescerem sentindo-se irmãos?

Alguns dizem que contar às crianças histórias de monstros pode ajudá-las a enfrentarem os seus medos, a pensarem no que podem fazer para ficar tudo bem, a não se deixarem paralisar pelo medo.

A ser assim, aproveitemo-nos da aberração humana que é Putin e façamos com que gerações de crianças vejam nele um monstro e cresçam sentindo-se os super-heróis capazes de destruir este ou um outro qualquer monstro igual a ele.

Que assim seja e Viva Ucrânia!

 

Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990