Portugal parece realmente estar na moda, até pelos cargos de relevância internacional que tem conseguido: Durão Barroso, António Guterres e agora Mário Centeno. Estamos finalmente a libertar- nos de uma certa vergonha e sentimento de inferioridade herdada dos tempos do Estado Novo?
Não temos complexos nenhuns de inferioridade. Portugal está na moda por diversos motivos. Somos um país de dimensão intermédia na Europa, mas os portugueses não devem nada aos outros. Nunca me senti inferiorizado em nenhuma reunião internacional. Por exemplo, hoje temos quatro universidades portuguesas no top europeu, nos cursos relacionados com os MBA e com a formação na área da economia e da gestão. Há um esforço que muitas pessoas desprezaram, e que desprezam, que foi o investimento que se fez na formação de milhares de pessoas, com imensa qualidade, e que colocaram estas universidades no topo. As três figuras referidas têm diferenças entre elas. O Dr. Mário Centeno não está lá por ser Mário Centeno, mas por ser o ministro das Finanças de Portugal, o que valoriza muito o País e o trabalho feito pelo Ministério das Finanças. As escolhas do engenheiro Guterres, que é uma pessoa excepcional e desempenhou um papel fantástico nas Nações Unidas, e do Dr. Durão Barroso foram por razões pessoais. O turismo colocou-nos na moda e tem uma importância enorme na economia do País. Portugal é muito hospitaleiro e está razoavelmente apetrechado. Se olharmos para a capacidade hoteleira do País hoje e o que era há 15 anos, a diferença é uma coisa abissal. Isto não tem a ver com os governos, mas com os empresários, que fizerem investimentos nos sítios certos. Lisboa e Porto são hoje das cidades mais atractivas da Europa. Há também uma valorização de Fátima. Hoje o turismo religioso tem uma importância enorme, tal como a importância do interior e de Belmonte. O País está muito atractivo. Por outro lado, as low cost trouxeram uma vida aos aeroportos portugueses absolutamente extraordinária e todos os anos se batem recordes, uma coisa impensável há 20 anos. Depois há uma coisa muito importante que é o aproveitamento do mar. O surf atrai a Portugal milhares e mihares de pessoas, que vêm fazer surf na Nazaré ou na Ericeira durante todo o ano. O mesmo se passa com o golfe. Portugal tem ainda uma capacidade de acolhimento que poucos países têm, um bom clima e possui uma gastronomia óptima e vinhos fantásticos, a bons preços. Nos inquéritos, imensos turistas referem que vêm a Portugal porque o vinho é muito bom e barato. Há que aproveitar as coisas boas que temos. Somos um país que se recolocou bem e espero que continuemos neste caminho.
Leia aqui a primeira parte da entrevista
Como analisa o momento actual de Portugal, em que parece que muitas pessoas já não se recordam que a troika acabou de sair do País?
A crise de 2007/08 afectou muito o País. Depois cometeram-se alguns erros na tentativa de recuperação, que não foram só nossos, mas também europeus. Tivemos um período muito difícil em 2010/11, o que obrigou a este acordo internacional para podermos ser "resgatados" para que Portugal pudesse voltar a respirar. Hoje em dia, o País parece estar a acompanhar aquilo que é a recuperação europeia. Mas precisamos de recuperar mais e de ter uma maior dinâmica, que só se consegue com um forte investimento estrangeiro. O País está muito depauperado. Tem uma dívida muito grande, que é um lastro negativo para Portugal, mas o investimento estrangeiro e a atractividade que o País tem podem ser muito favoráveis. Temos razoáveis recursos humanos e há vontade dos investidores para investir. Isso pode-nos permitir um ritmo de crescimento razoável. Há potencialidades para isso. Há muitos sectores que necessitam de uma maior coesão e organização e de uma estratégia mais bem definida. Por exemplo, a exportação brutal que se faz de produtos como pêra rocha e framboesas. A zona da Estremadura e do Oeste exportam tanto como o vinho de todo do País, incluindo o vinho do Porto. Isto é uma capacidade de exportação brutal. Há que ser capaz de dinamizar o interior, que foi muito abandonado e tem uma população muito envelhecida. Os incêndios revelaram um País rural, pobre e sem voz. Ou seja, um País que integra pessoas que ninguém ouve. Só são ouvidas nas situações de calamidade. Isso é muito negativo. A iniciativa do senhor Presidente da República de se criar um grande incentivo às políticas para o interior não deve ser desperdiçada. Era muito importante que o País olhasse para o interior e o reconstruísse. Não se pode é querer reconstruir o interior com os instrumentos antigos. O País tem uma rede de comunicações rodoviárias absolutamente fantástica. Temos auto-estradas para quase tudo e acho que vão servir para qualquer coisa. Há críticas, mas pior foi o dinheiro que se gastou em formação inútil. Aí é que houve algum dinheiro verdadeiramente deitado à rua, porque se inventaram muitos cursos, que não tiveram qualquer espécie de impacto, nem para as pessoas nem para a economia do País. O investimento nas auto-estradas pode ter sido excessivo, mas pode ter uma utilidade. Por outro lado, o País precisa de alguma tranquilidade e de alguns acordos nas áreas da Justiça, da Educação e na lei eleitoral. Os países não progridem só por terem gente qualificada. Progridem quando têm uma estabilidade política e fiscal, e quando têm uma capacidade financeira com um sistema bancário robusto, empresários activos e associações empresariais com estratégia. O País deveria ter a meta de mais de 50% do seu PIB [Produto Interno Bruto] ser resultado de exportações. Há uma frase que escrevi no meu livro, que diz que o "País precisa de um choque de bom senso. Não podemos continuar com as escaramuças entre partidos e com estes ataques pessoais que nada resolvem, mas que desgastam partidos, políticos e sistema democrático.”
A vitória de Donald Trump nos Estados Unidos é um risco para a estabilidade mundial?
É um risco enorme que todos os dias se manifesta. A decisão de reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel é perfeitamente incendiária do Médio Oriente. É uma decisão muito mais de política interna do que de
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