Economia

Flexibilidade nos horários ajudaria vida pessoal. Lei permite, mas nem sempre é aplicada

22 fev 2019 00:00

Passamos muito tempo no emprego, mas nem por isso somos mais produtivos. Mudança de paradigma tem vindo a ser reclamada, com a flexibilidade a ser apontada como a melhor solução

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Raquel de Sousa Silva

Acabar com o almoço antes que o almoço acabe connosco. É este o título de um texto assinado por Henrique Raposo e publicado na semana passada no Expresso, no qual o escritor e colunista deste semanário defende que o hábito português de uma hora ou mais de almoço nos dias de trabalho “é um dos nossos maiores problemas económicos”.

Com almoços alargados, a jornada de trabalho acaba por se estender, com muitos trabalhadores a chegarem a casa depois das 19 ou mesmo das 20 horas. Este dia-a-dia “torna impossível a maternidade ou paternidade”.

Para Henrique Raposo, “a nossa fraca produtividade e a nossa baixa natalidade, talvez os nossos maiores problemas de fundo, têm a sua primeira raíz no absurdo hábito do almoço gigantesco durante a semana de trabalho”.

A questão dos horários que se estendem e do trabalho que se prolonga, no escritório ou em casa, tem sido assunto recorrente. Já em 2016, aquando da apresentação de um estudo sobre o impacto do excesso da carga horária laboral na saúde e na vida familiar, o psiquiatra Pedro Afonso alertava que “estamos passivamente a aceitar um novo tipo de esclavagismo”.

Hoje, em Portugal, e exceptuando o comércio e o trabalho por turnos, os horários são de 40 horas semanais, com dois dias de folga ao fim-de-semana, o que significa uma jornada de trabalho diária de oito horas.

Para António Poças, empresário e presidente da Nerlei, dois períodos de trabalho de quatro horas é a solução que “proporciona o maior equilíbrio”. Defende que, “quando possível”, a flexibilidade na hora de entrada e de saída e na duração da pausa de almoço “será a melhor forma de conciliar a vida profissional e pessoal”.

Mas, alerta, a necessária e desejada flexibilidade “não está plasmada na lei, devido à necessidade de proteger os abusos por parte das empresas, e esse facto acaba por tornar muito rígido o acordo de horário com os trabalhadores, indo contra os seus próprios interesses”.

Pedro da Quitéria Faria afirma que a legislação contempla já uma série de mecanismos que permitem a flexibilidade (aponta o banco de horas, os regimes de teletrabalho, os contratos intermitentes e o regime de adaptabilidade), mas frisa que, “na prática, estes mecanismos são pouco usados”.

Deve-se isto, na opinião do especialista em direito laboral, à cultura empresarial vigente - “o empregador entende que se a pessoa estiver em casa pode não estar realmente a trabalhar” - e à mentalidade dos próprios trabalhadores, que entendem que a sua posição pode ficar fragilizada por falta de reporte face aos seus superiores.

O advogado lembra que nem todos os sectores são passíveis de ser alvo de aplicação de mecanismos de flexibilidade. “Não se imagina que um trabalhador fabril possa trabalhar a partir de casa”. Por outro lado, os instrumentos de regulação colectiva podem também não permitir a aplicação desses mecanismos.

Para o presidente da Nerlei, hora de entrada e de saída e duração do almoço são factores que variam de pessoa para pessoa, e também ao longo das fases da vida. “Há quem prefira ter uma hora de almoço mais longa porque lhe permite ir a casa, ou tratar de algum assunto pessoal, ou mesmo ir ao ginásio; há quem prefira entrar mais cedo e sair mais cedo porque deixa os filhos a essa hora na escola, mas também há quem prefira fazer exercício de manhã e começar mais tarde”.

António Poças entende que, de modo geral, “os problemas de horários em Portugal ocorrem nos locais com horários de funcionamento superior às 40 horas semanais e em que a conjugação dos turnos torna difícil a normalidade do dia-a-dia”.

Quanto à possibilidade de reduzir a hora de almoço para antecipar o fim da jornada, considera que faz sentido nas empresas situadas em centros urbanos. Mas defende que, ainda assim, é preferível apostar na flexibilidade, “garantindo um tempo mínimo comum a toda a equipa e períodos do dia em que umas pessoas estão a trabalhar e outras não, de forma a ajustar à preferência e necessidade de cada u

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