Sociedade

Jorge Abreu: “O País não pode continuar a ignorar 70% do território”

15 jun 2018 00:00

O presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos considera que é urgente caminhar no sentido de inverter a desertificação no Pinhal Interior

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Leia aqui a segunda parte da entrevista

Apesar do drama, os incêndios atraíram a atenção do País para esta região. De que forma podem aproveitar a tragédia a seu favor?
Não gosto do termo aproveitamento de uma situação que lamentamos muito e que gostaríamos que fosse reversível. No entanto, uma vez que se verificou o trágico acontecimento temos, de uma vez por todas, que estar cada vez mais unidos e trabalhar em prol desta região. A tragédia dos incêndios veio reforçar aquilo que era a nossa luta em relação ao litoral e veio chamar a atenção para esta zona do País. O país real acabou por ficar consciencializado da realidade existente no interior. Nunca nenhum governo deu a devida atenção a estes territórios, apesar de nunca deixarem de os ter em consideração. Era para se ir fazendo. Antes dos incêndios, o Plano de Revitalização para o Pinhal Interior e o Plano de Coesão Territorial já estava a ser elaborado, mas foi pós-incêndio, onde a Unidade de Missão teve um papel fundamental, que houve outra consciencialização. Não há um pacto de regime, mas há uma preocupação de todas as forças políticas em fazer alguma coisa pelo interior. Nós, autarcas, não podemos deixar que isto saia de cima da mesa. Ninguém nos vai perdoar e vamo-nos sentir extremamente mal se daqui a dez anos voltarmos a passar por uma situação destas.

O facto dos campos terem sido abandonados também contribui para a propagação dos incêndios?
Sem dúvida. Uma das razões dos incêndios é o abandono das populações. Um dos problemas estruturais desta região é a falta de pessoas, que já vinha antes dos incêndios. Estes acabaram por ser uma consequência de tudo isto. Se conseguirmos implementar o plano de revitalização para o Pinhal Interior tem lá tudo o que é necessário. Temos consciência que a inversão da desertificação terá de ser feita de forma gradual. O País não pode continuar a ignorar 70% do território. Junto ao litoral temos 70% da população, em 70% do território temos 30% da população. Esta desigualdade não interessa ao País. Temos obrigatoriamente de fixar pessoas aqui. Como? Pelos postos de trabalho e não é com a política do poder central querer fechar tudo quanto são serviços públicos. O sector privado tem de ter algumas condições diferenciadas para investir e não podemos ir com 'paliativos', como baixar o IRC. Isso não traz ninguém aqui. Têm que ser situações evidentes, quase de imposição do poder central. Por exemplo, implementar determinado tipo de actividade nesta região, levando a que as empresas se implantem no interior. Só fixamos pessoas se forem criadas raízes familiares. A qualidade de vida existe. Mas as pessoas também têm de ter uma mais-valia evidente para se deslocalizarem.

A aposta tem de ser na fixação de casais jovens?
Temos que fazer esse caminho. Desde que os jovens não saiam já estamos a inverter essa posição. Temos consciência que é um caminho lento que se vai trilhando e por isso deveria haver um acordo entre os principais partidos – PS e PSD - com a noção essencial de ter que alterar isto e ir fazendo esse trabalho. É com as pessoas e a sua fixação nesta zona que se faz a diferença.

O que prevê esse plano de revitalização?
É muito transversal ao nível da saúde, da educação, da assistência da segurança social, ao nível industrial e das infra-estruturas municipais, ou seja, é um plano que está mesmo direccionado para esta região. Não dizemos que tem de ser tudo implementado, mas está ali o caminho. Não é preciso fazer mais diagnósticos. Agora é preciso começar a trabalhar gradualmente, dentro das possibilidades. Aliás, não podemos, de um momento para o outro, deslocalizar as empresas todas para aqui, até porque corríamos o risco de não ter capacidade de resposta ao nível dos trabalhadores com formação. Para isso precisamos de ter gente jovem e especializada. É preferível ir caminhando no sentido tipo "bola de neve". À medida que vai rolando, vai engrossando e as coisas vão andando. Já referiu publicamente que a ‘guerra de capelinhas’ impediu alguns projectos importantes para a população.

O futuro terá de passar por iniciativas intermunicipais?
Estamos a caminhar pela intermunicipalidade através das comunidades intermunicipais. Há uns anos isso não era possível. Cada um tinha a sua quinta e não conversava, fechava-se e até queria esconder o jogo do concelho do lado. Com esta nova geração de autarcas é totalmente diferente. Temos de ser conscienciosos e investir em conjunto. A nossa piscina, por exemplo, é usada também por pessoas de Castanheira de Pera e de Pedrógão Grande. Estamos a falar de 15 minutos de carro. Numa cidade faz-se 20 minutos para ir ao pavilhão ou ao ginásio. As pessoas, gradualmente, começam a aceitar isso e os investimentos assim são rentabilizados e têm utilidade. A intermunicipalidade vem-nos trazer este contacto permanente com os colegas e nós temos consciência: vamos investir nisto para os três [Castanheira, Figueiró e Pedrogão] ou para os cinco, se incluirmos Alvaiázere e Ansião e abdicamos de outro projecto. Por exemplo, um fica com a área da saúde e outro com a do desporto. O próprio quadro comunitário dá prioridade aos projectos intermunicipais. Seria complicado avançar para a regionalização e nem vejo que nenhum partido, mesmo que acredite nisso, queira tomar essa decisão. O caminho é através da intermunicipalidade.

Faz sentido falar em interioridade tendo em conta que apenas cerca de 200 km separam a fronteira de Espanha e o litoral de Portugal?
Não faz sentido falar em litoral e interior. Se vem 

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