Sociedade
Quarenta agentes da PSP da região Centro manifestam-se em Lisboa por melhores condições de trabalho
Salários têm de, obrigatoriamente, aumentar para atrair agentes
Cerca de quatro dezenas de agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) da região Centro rumaram esta tarde de autocarro a Lisboa a fim de participarem numa manifestação devido à “desmotivação” para apresentarem reivindicações diversas, entre elas melhores salários.
A Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP) realiza hoje à tarde uma manifestação em Lisboa, em frente ao Parlamento, contra o arrastar dos problemas que afectam a PSP e os polícias e contra a “falta de vontade política do Governo para os resolver”.
O Sindicato Independente dos Agentes de Polícia já anunciou que se vai juntar à caminhada, que vai decorrer entre o Largo de Camões e a Assembleia da República.
A lista de exigências foi apresentada pelo dirigente sindical, Rui Gaspar.
Durante a viagem de autocarro, enquanto viam o jogo Portugal-Gana, do campeonato mundial de futebol, nos telemóveis ou ouviam o relato, as conversas intercalavam entre a equipa do treinador Fernando Santos e os problemas que existem na polícia e que, segundo estes polícias, tardam em ser resolvidos.
O vogal da ASPP e dirigente da zona Centro, Rui Gaspar, sublinhou que os salários têm de, obrigatoriamente, aumentar para atrair agentes para a PSP.
“No último curso, dos 1020 candidatos, só foram aprovados 643 e veremos se todos se apresentam. É necessário aumentar os vencimentos. Um polícia em início de carreira ganha cerca de 1030 euros limpos, incluindo o suplemento por turnos. Preocupa-me esta falta de candidatos”, afirmou este agente, que presta serviço em Leiria.
Recordando que, quando iniciou a carreira, há 23 anos, ganhava dois salários mínimos, Gaspar referiu que hoje, um polícia ganha quase tanto como o actual salário mínimo.
"Preocupa-me esta situação, porque temos cada vez menos pessoas na PSP. Se nada mudar arriscamo-nos a deixar de ter agentes”, alertou, ao recordar que os operacionais que se aposentam não são substituídos.
Rui Gaspar acrescentou que, quando um agente entra na profissão é colocado longe de casa, muitas vezes, em Lisboa, onde o “custo de vida é elevado” e, com o seu salário, “tem de pagar alojamento, deslocação e alimentação”.
Esse é o caso de um jovem de 23 anos, o agente mais novo na comitiva que incluía elementos de Coimbra, Leiria, Marinha Grande, Caldas da Rainha e Nazaré. Entrou para a PSP há dois anos e meio e foi colocado em Lisboa.
O ordenado ultrapassa pouco os mil euros limpos e ainda é necessário pagar alojamento, alimentação e as deslocações para visitar a família, a cerca de 130 quilómetros de Lisboa.
“Não estou arrependido, porque queria ser polícia, nem fui enganado, porque conhecia as condições, mas é preferível um jovem ter outro tipo de trabalho a ganhar o mesmo, com muito menos riscos e está em casa”, destacou durante a viagem para Lisboa.
Lembrando, precisamente, a responsabilidade e os riscos que a profissão exige, Rui Gaspar criticou o Governo “quando afirmou que está a dar o maior aumento que até hoje foi dado às polícias”.
“Esse aumento é igual a toda a função pública e está muito abaixo do nível da inflação. Temos perdido regalias nos últimos anos, como o sistema de saúde que era quase gratuito. Tudo é desmotivante e não atrai pessoas para a PSP”, reforçou.
O vogal da ASPP reivindica ainda melhorias nas condições de trabalho, nomeadamente ao nível da frota automóvel e de intervenções nas esquadras. “O comando de Leiria e a esquadra de Pombal, por exemplo, precisam de obras urgentes”, disse.
Outro agente adiantou à Lusa que “todos os dias” faz o seu melhor” e que os cidadãos não se podem queixar do empenho, mas reconheceu que não gosta “do que se está a passar na polícia”.
No mesmo sentido, outro elemento lamentou que a imagem da polícia esteja a ser degradada diariamente, porque “não há contraditório” e ninguém os defende, disse referindo-se a uma reportagem que mostra agentes no ativo que divulgam mensagens que incitam ao ódio, discriminação e violência nas redes sociais.
Por outro lado: “As pessoas deixaram de gostar de nós e veem-nos como aqueles que estão na caça à multa”, lamentou.
As conversas durante a viagem acabam por ir parar a diferentes experiências que sentem e que vivem no seu dia-a-dia.
Segundo um dos agentes, a falta de recursos humanos é transversal ao país e “os comandantes têm objetivos para cumprir e quando é preciso montar operações stop veem-se vários agentes”.
“Então não há polícia para proteger os cidadãos na rua, mas há para autuar os cidadãos, que até cumprem na sua maioria, para arrecadar dinheiro para o Governo?”, questionou um agente, ao afirmar que são os agentes que dão a cara perante a população.
Antes da paragem para esticar as pernas e comer umas sandes na área de serviço de Loures, a pré-aposentação era outro dos temas que ocupavam a atenção de alguns dos elementos.
“Exigem o mesmo a um jovem de 30 anos e a um agente de 56 anos. Não pode ser. Já não tem a mesma capacidade física e mental”, diziam.
Este agente considerou que quem está a sofrer com toda a situação da polícia são os cidadãos. “Não conseguimos estar perto delas quando precisam. Não temos gente para estar em todo o lado. E chegar uma hora depois junto de uma pessoa que sofreu uma agressão ou um roubo é até uma falta de humanismo”, criticou.
“Indignado” com o facto de a PSP só libertar os agentes para pré-aposentação a dois anos da reforma, o agente constatou o “envelhecimento” da classe. “Basta olhar para as pessoas que vão neste autocarro. A média de idades há de rondar os 45/50 anos. As pessoas estão velhas e cansadas e a violência é cada vez mais grave. É precisa uma dinâmica mais forte”, defendeu.
Outro elemento abordou a questão dos suicídios na polícia, que “tentam desvalorizar”.
Alguns apelam à “maioria silenciosa” – a sociedade – para se manifestar pela sua segurança.
“São os mais prejudicados com a falta de elementos por falta de atractividade. Não podemos chegar tarde às ocorrências, como acontece, mas não temos o dom da ubiquidade. Não queremos alertar a população, mas as coisas não estão bem servidas em termos de segurança”, referiu.