Opinião

A culpa morre sempre solteira

26 nov 2015 00:00

Em Portugal tudo fica no ar, e raramente há consequências e ficamos com um sentimento que a justiça não acompanha o que se passa.

Já reparou, diz D. Genuíno, que em Portugal a culpa morre solteira? Será que alguém virá assumir a responsabilidade pelas circunstâncias a que chegamos? Esse é um traço constante, observável em diferentes momentos históricos da vida portuguesa, diz Dona Mécia. De onde virá esta caraterística? Em Portugal tudo fica no ar, e raramente há consequências e ficamos com um sentimento que a justiça não acompanha o que se passa.

Normalmente, quando examinamos a vida de um país, há três forças que é necessário avaliar. Três forças, pergunta D. Genuíno? Sim três forças: uma é a sociedade civil, que neste momento mostrou nas eleições o que pretende. A outra força é o Governo. E finalmente, a terceira força é a conjuntura internacional que influencia qualquer país. Assim uma resposta a um problema internacional implica que pelo menos estes três fatores tenham um funcionamento harmónico.

E a conclusão, pergunta D. Genuíno? A conclusão, responde Dona Mécia, é que em Portugal a harmonia entre estas três forças não existe. Com frequência, em Portugal a desarmonia foi um lugar-comum. E tendo em atenção que Portugal sofreu sempre uma evolução extremamente alarmante, a história mostra-nos que necessitámos sempre de um apoio externo.

Sempre, pergunta D. Genuíno?

Sim, sempre, o Afonso Henriques pediu apoio à Santa Sé. A segunda Dinastia pediu à aliança inglesa e pagou caríssimo. No fim do império, o único apoio que restou foi a União Europeia. O país, na sua ligação com o mundo, é muitas vezes exógeno. Quer dizer: sofre as consequências de causas em que não participou. Um exemplo: a Guerra de 14/18. Portugal participou nas causas? Não. As consequências, quer em Moçambique, quer em Angola, quer na Flandres foram enormes. Assim, somos um “estado exíguo”, pois que a relação entre os recursos do país e os objetivos do país é deficitária. Quando essa equação (recursos objetivos) chegou à situação de desastre em que nos encontramos, o país ficou em regime de protetorado.

E quais os remédios para a nossa doença, pergunta D, Genuíno?

Em primeiro lugar é preciso restaurar um valor importante: o da confiança. A confiança entre a sociedade civil, Estado e conjuntura internacional. Parece-me que tem havido uma certa dificuldade, da parte do Governo, em compreender que há uma diferença entre a legitimidade eleitoral, que justifica a tomada de poder, e a legitimidade do exercício de poder, que começa a ser avaliada no dia seguinte à tomada de posse.

Por outro lado, continua Dona Mécia, temos de resolver a crise de valores, e de cultura, que afeta a sociedade.

E a conjuntura internacional? Sobre ela não podemos atuar, conclui Dona Mécia. Embora a culpa morra solteira, não se pode dizer que é a sociedade civil que tem mais responsabilidades. Pagamos as dívidas que o novo-riquismo do Estado desenvolveu, e o que sobeja, é a vida de cada ser humano.