Opinião

A Misericórdia merecia melhor

11 dez 2015 00:00

Talvez fosse oportuno que D. António Marto, Bispo Diocesano, interviesse acalmando as ovelhas do seu rebanho mais excitadas com as lutas mundanas, lembrando-lhes que os princípios do Cristianismo são outros.

As últimas semanas têm sido particularmente agitadas para os irmãos da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, com as duas candidaturas que se apresentam às urnas a trocarem palavras de acusação e de suspeita.

O que se tem assistido não dignificaria nenhuma instituição, sendo mais grave, naturalmente, por se tratar de uma Misericórdia, que tem personalidade jurídica canónica e que procura alcançar os seus objectivos respeitando “princípios do humanismo e da doutrina e moral cristãs”, como se pode ler no documento “Compromisso da Irmandade”.

O mesmo documento refere ainda que todos os irmãos têm o dever de “honrar, defender e proteger a Santa Casa da Misericórdia” e coloca como condição nas admissões que se “aceitem os princípios da doutrina e da moral cristã e revelem, pela sua conduta social ou pela sua atividade pública, respeito pela fé católica e seus fundamentos”.

No entanto, pelo que tem chegado a público, a disputa pelo cargo de provedor, a que concorrem Fernando Lopes e Carlos Poço, tem sido feita através de uma guerra de palavras difícil de enquadrar nos “princípios do humanismo e da doutrina e moral cristãs”, não se percebendo também, com esta forma de actuar, como estão os actuais provedor e vice-provedor a “honrar, defender e proteger a Santa Casa da Misericórdia”.

No fundo, o que passa para a opinião pública, eventualmente pouco conhecedora dos problemas da instituição, é que a luta pelo poder na Misericórdia não é muito diferente das que vamos vendo noutras áreas, numa lógica do “vale tudo” para se alcançar o objectivo. Pouco importa o que se diz ou se faz, ou se isso colide de frente com os princípios inerentes ao lugar que se ambiciona.

Primeiro há que ganhar, alcançar o poder. Seja de que forma for. Depois, então, vêem as palavras bonitas e de circunstância. Respeitadoras do que se espera de quem ocupa o lugar. Como os camaleões, muda-se de registo como estes alteram a cor. Sempre de acordo com o que é mais conveniente. Não há que estranhar. A população já está habituada a isso.

Seja na política, no desporto, na saúde ou na educação, quando toca a lutar por um 'lugar ao sol', o nível costuma descer ao que de mais rasteiro existe, geralmente envolvendo um 'lavar de roupa suja' para o qual há já pouca paciência. Mas na Misericórdia, até por respeito pela palavra, podia haver um certo pudor na forma como se demonstra a ambição. Esperar-se-ia que numa instituição com os seus objectivos e com os princípios que preconiza que as coisas fossem diferentes. Pelos vistos, não são.

Talvez fosse oportuno que D. António Marto, Bispo Diocesano, interviesse acalmando as ovelhas do seu rebanho mais excitadas com as lutas mundanas, lembrando-lhes que os princípios do Cristianismo são outros. Poderá, inclusive, aproveitar o momento e dar como exemplo do que se espera de uma Misericórdia os voluntários que, desinteressadamente, se entregam de alma e coração às mais variadas causas sociais. Nesta edição do Jornal de Leiria mostramos o rosto de cinco deles.