Opinião

Água, por favor

9 nov 2017 00:00

Geralmente damos pouco valor ao que temos, mesmo quando de trata do que há de mais essencial para a nossa sobrevivência.

É o caso da água, um bem precioso que em alguns países rareia e é tratada como uma rainha, mas que por cá é olhada com a indiferença de quem a dá como garantida.

Só isso explica que nos demos ao luxo de a utilizar sem qualquer parcimónia, seja em casa, na agricultura ou na industria, e que, pior, continuemos a permitir que boa parte seja desperdiçada ao longo do seu transporte ou que muitas indústrias a utilizem como esgoto para os seus resíduos.

Bastaria uma viagem, por exemplo, a Israel, para observar o investimento em tecnologia, investigação e infra-estruturas que aquele país canalizou para a captação de água e sua optimização, assim como para perceber o cuidado que esse povo tem na utilização desse bem, para fazer abanar as nossas consciências. Para nos fazer ver as coisas de outra forma, para percebermos o quão estúpidos temos sido.

Quando o problema nos bate com mais intensidade à porta, como aconteceu este ano, os alarmes tocam e toda a gente fala dele com preocupação. No entanto, passado o pior, as atenções voltam a direccionar-se para outros lados e a preocupação esmorece, ficando meia-dúzia de ambientalistas a falarem sozinhos de um problema que é de todos e cuja tendência é agravar-se a curto prazo.

No entretanto, até novo alarme geral, as pessoas voltam às suas verdadeiras preocupações que, salvo outras situações em que o essencial esteja em causa, passam muito pelo consumo e em arranjar formas de o pagar. Da parte das instituições responsáveis, começando pelo Governo e acabando nas autarquias, o assunto também não parece merecer particular preocupação para lá do imediato, não sendo visível uma estratégia consistente, com pensamento no futuro.

Se assim não fosse, já há muito que teríamos tentado perceber como fazem os países que vivem com este problema há mais tempo, adaptando ao nosso as melhores soluções, de forma a estarmos preparados para um agravamento da situação. Ao invés, continuamos com diversos casos característicos de terceiro mundo, de que a Ribeira dos Milagres é apenas um exemplo, e a olhar com alguma ‘dor de cotovelo’ para países com elevados índices de crescimento económico mas onde o ar é irrespirável em muitas cidades e a água corre sem qualquer ser vivo em diversos leitos, vindo-nos rapidamente à cabeça o caso da China.

No fundo, e olhando racionalmente para a questão, não temos a pujança económica e a riqueza material de outros países, mas a água corre potável nas nossas torneiras e ainda podemos passear sem uma máscara protectora de poluição. O problema está nas expectativas das pessoas, que dando como certo esses privilégios, ambicionam outros de natureza mais material.

Com esta mentalidade, virá o tempo em que ter água potável a correr sem condicionantes nos canos será um luxo ao alcance de poucos. Um tempo em que água valerá mais do que o petróleo ou o ouro, e em que se contarão histórias de um antigamente em que antepassados com as prioridades trocadas, deram cabo dela sem dó nem piedade.

*Director do JORNAL DE LEIRIA