Opinião

Caminhos (im)possíveis

7 out 2023 16:32

Com crises climáticas e migratórias, dificilmente os modelos democráticos liberais irão sobreviver incólumes

A minha última crónica nas páginas deste jornal falava não só sobre o fim do milagre chinês, como de um novo futuro que se avizinha, em que “modelos de mundo” conflituantes colidem - as democracias liberais (bloco Europa e UE) com os modelos autocráticos da China (uma tecnocracia, autocrática), da Rússia (quási-ditadura) ou de uma Arábia Saudita (a autocracia “inspirada”). África e América Latina são disputadas por estes novos modelos de mundo.

Decorreu tempo suficiente desde a segunda guerra mundial para, como muitas vezes fazemos enquanto espécie humana, voltarmos a cometer os mesmos erros. Nas novas gerações ninguém viveu verdadeiramente oprimido ou foi perseguido, por isso os populismos crescem em diversos locais.

A resposta para os problemas complexos, que requerem soluções igualmente difíceis, está sempre na mensagem fácil, nas reações imediatas (a culpa é da imigração, é do Governo, é do liberalismo ou da falta dele, etc.).

Somos vítimas de uma sociedade de impulso onde, curiosamente, não nos é dito o que pensar (como em ditadura) mas somos nós que caímos na pequena armadilha do algoritmo e escolhemos a informação em que queremos acreditar (o mundo tornou-se como que um grande conjunto de fações de clubes de futebol - “o meu clube é melhor do que o teu, o teu é corrupto” – os dados são escolhidos a dedo, mas metáfora do espelho é perdida no ódio).

Neste contexto, é difícil tomar decisões de longo-prazo. Portugal tem uma situação instável e tem sofrido muito com a inflação, mas por outro lado o seu rating foi revisto em alta na última semana e o PIB cresceu, em termos reais, 6,8% em 2022 (a maior taxa desde 1987). Aqueles que falam do crescimento da R. Checa, Eslovénia, Polónias, etc., esquecem-se do argumento da centralidade e da educação (já nestas páginas debatido) mas, num contexto de recessão alemã e estagnação do RU, o nosso desempenho económico é bastante bom.

O problema é que Portugal é um dos países da OCDE com maior desigualdade de rendimento, pelo que este crescimento não tem chegado a todos.

Por outro lado, uma opção ideológica do Governo de não fazer crescer salários dos funcionários públicos, tem deteriorado os serviços públicos (com impacto na população que mais necessita deles) – curiosamente, muitos partidos que apontam este falhanço são os mesmos que apontam o dedo ao peso do Estado (número de funcionários, salários de professores e médicos, etc.), quando este é já bem inferior à média da OCDE.

Neste contexto, com crises climáticas e migratórias, dificilmente os modelos democráticos liberais irão sobreviver incólumes. Portugal precisa de melhorar os seus serviços, canalizar investimentos de forma inteligente (falta uma clara aposta na cadeia de valor da mobilidade elétrica, que é uma tremenda falha no rol do nosso PRR), continuar a atrair investimento, melhorar qualificações, etc.

E para regiões como a nossa nunca foi tão importante pensar o futuro. Será que ainda é possível?