Opinião

Concentração e inflação

14 abr 2023 16:38

A eterna procura pela eficiência prevista por diversos economistas transformou a gestão numa ciência centrada na eliminação do desperdício

Nos últimos meses a conversa sobre a colusão de preços, poder de mercado e inflação voltou à ordem do dia? Estarão ou não algumas empresas a inflacionar preços e margens de lucro, contribuindo para a inflação? A resposta é sempre difícil porque a inflação tem muitas causas, sendo que as duas mais prováveis estão ligadas à expansão da massa monetária no pós-Covid e aos problemas logísticos então verificados.

Mas a inflação de margens parece real não só na Europa, como em Portugal. A narrativa macroeconómica dominante na zona euro nos últimos nove meses centrou-se em aumentos acentuados dos preços de vários bens e serviços, conduzindo a custos mais elevados para as empresas.

Em resposta, o Banco Central Europeu (BCE) aumentou as taxas de juro para arrefecer a procura, temendo que os preços mais elevados no consumidor empurrassem os salários para cima e criassem uma espiral de inflação.

Contudo, numa recente reunião do BCE, os dados apresentados aos decisores políticos mostraram que as margens de lucro das empresas têm vindo a aumentar, em vez de diminuir, como seria de esperar quando os custos dos fatores de produção aumentam acentuadamente.

Isto sugere que as empresas da zona euro têm vindo a aumentar os preços para além dos seus valores de produção e comercialização à custa dos consumidores e dos assalariados. A inflação alimentada por margens empresariais mais elevadas tende a autocorrigir-se à medida que as empresas acabam por travar os aumentos de preços para evitar a perda de quota de mercado.

Os salários têm crescido muito mais lentamente do que a inflação, o que implica uma queda de 5% no nível de vida do trabalhador médio da zona euro em comparação com 2021. Isto é bem diferente da inflação gerada pelos salários que caracterizou os anos 70 (que tem sido utilizada como padrão para as respostas adequadas dos bancos centrais).

Em Portugal este fenómeno parece evidente, já que muitos setores são dominados por poucas empresas (por exemplo, na Alemanha os preços da energia caíram 70% em 2023, quando em Portugal tardam em descer).

Na verdade, a eterna procura pela eficiência prevista por diversos economistas transformou a gestão numa ciência centrada na eliminação do desperdício. Mas esse foco excessivo na eficiência levou a consequências negativas, uma vez que criou um sistema altamente especializado e desigual, no qual poucos concorrentes dominam o mercado.

Ao contrário do que previam os modelos matemáticos, os ganhos de eficiência criam uma vantagem duradoura para alguns intervenientes, levando a uma distribuição de Pareto onde a maioria da riqueza e dos recursos está concentrada em poucas mãos. O que em si não é necessariamente mau porque, como consumidores, beneficiamos desses ganhos de eficiência até ao momento em que eles se transformam em abuso de posição dominante. Este é um tema complexo e de resolução difícil. Resta-nos esperar por políticas mais assertivas e inteligentes.