Opinião
E o número de mortes?
Surgiu o problema do reforço da vacinação e aí, de novo, se titubeou, arrancando-se tarde
Meu caro Zé,
Desde a nossa última conversa muitas coisas sucederam, umas mais previsíveis, outras menos.
Entre estas figura, sem qualquer dúvida, a maioria absoluta conquistada por António Costa e o Partido Socialista (atenção: maioria absoluta de deputados, mas não dos votos dos eleitores).
Ninguém esperava, nem os próprios, que já tinham deixado esse objetivo de lado. E, inopinadamente, aí está ela “caída no regaço”.
Entre as diversas razões apresentadas para esse resultado, para além dos erros e incoerências de outros partidos, emerge, com grande relevância, a alegada boa gestão da pandemia. Mas, terá sido mesmo uma boa gestão?
Que fique claro que entendo que o Governo reagiu bem a várias situações que a pandemia foi criando, mas terá agido, com antecipação, planeamento e prontidão como se impõe a um Governo, ou terá apenas reagido quando as situações eram já evidentes?
A escolha desta pergunta resulta da estranheza com que se tem menorizado a leitura, e a consequente preocupação daí resultante, do indicador que, do meu ponto de vista, é o mais importante no contexto de uma sociedade que deve valorizar a vida, ou seja, o número de mortes que, mesmo agora e já arrastadamente há várias semanas, continua elevado, apesar da melhoria nos outros indicadores escolhidos, como o número de internados nos cuidados intensivos.
É que este número, como se depreende facilmente, não é independente do número de mortes.
Alerto para a falta de busca de justificação para este indicador, cuja necessidade se tornou evidente em várias fases da pandemia.
Assim, no início, foi claro o disparate de desvalorizar o uso da máscara, embora o desconhecimento que rodeava o comportamento do vírus possa justificar hesitações sobre o processo de o defrontar.
Depois da hesitação, o Governo (e a população, não esquecer) reagiu bem, a ponto de sermos considerados um exemplo.
Só que, depois do início do ano 2021, perante uma vaga de terrível dimensão, a obstinação ideológica levou a que, entre a segunda e o final da sexta semana de janeiro, a pandemia tivesse provocado a morte a 7433 pessoas, ou seja, cerca de 36% (mais de um terço) de todas as provocadas até hoje.
Mas vieram as vacinas, e depois de um início desastrado (lá vem o erro!), houve uma feliz e excelente emenda que nos levou, outra vez, aos píncaros do exemplo.
Só que surgiu o problema do reforço da vacinação e aí, de novo, se titubeou, arrancando-se tarde, embora, cá está a boa reação, se tenha acelerado depois o processo.
Contudo, terá sido porventura esse atraso, dado o papel reconhecidamente relevante da terceira dose na defesa contra a agressividade do vírus, que levou Portugal do país exemplar, ainda em novembro de 2021, no que toca ao indicador da mortalidade, ao 19º lugar no contexto da União Europeia no final da sexta semana de 2022.
E não será esse número de mortes um indicador gritante?
Até sempre
Texto escrito segundo as regras do Acordo Ortográfico de 1990