Opinião

Eutanásia – sabemos o que queremos?

17 dez 2022 11:07

No debate que se centrou muito na bolha política, muitas questões foram mal apresentadas e deficientemente explicadas

Nas últimas semanas muito se tem discutido, mais uma vez, já é a terceira, a despenalização e legalização da eutanásia, tendo sido aprovada no Parlamento na passada sexta-feira a lei que legaliza a morte medicamente assistida.

E aqui começa, no meu entender, uma das grandes limitações da discussão dum assunto tão importante, e que envolve a possibilidade de decisão individual sobre a concretização deste tipo de morte.

Porque se trata duma votação na Assembleia da República, com toda a legitimidade dos seus 230 deputados, mas num tema que deveria ir muito além da discussão política, porque se trata da vida humana, e por isso entendo que este universo de decisão é manifestamente reduzido perante a sua consequência última – a decisão sobre a morte de alguém.

Devo dizer que, pessoalmente, tenho algumas dúvidas por esclarecer sobre este tema, e não serei o único, pelo que, me parece que teria sido muito interessante ter havido muito mais informação, e discussão, sobre os prós e contras duma decisão sem reversibilidade.

Discussões sérias visando o esclarecimento correcto e a informação de todos quantos, no final, poderão ser os decisores – cada um de nós. Mas, infelizmente, por estas semanas o País esteve mais preocupado em assistir ao Mundial do Catar, com a presença da nossa selecção, e em discutir se Ronaldo deveria ter jogado ou não e se Fernando Santos tem condições para continuar a ser selecionador nacional.

E fez falta, muito mesmo, que a sociedade tivesse sido convocada, por quem de direito, para estar atenta e particularmente interessada sobre os pormenores duma lei que tem a possibilidade de permitir a morte duma pessoa. E este não é um trabalho que se faz em poucas semanas ou meses.

Por isso, acompanho a posição de Luís Montenegro, não por ser o presidente do partido onde milito, mas por convictamente entender que esta é uma matéria onde os portugueses deveriam ter a oportunidade de se pronunciar, de forma informada, e dessa maneira alargar a responsabilidade da decisão a um universo que nada teria a ver com os 230 deputados.

Claro que se tivesse sido esta a escolha para fazer este debate, teria havido muito mais informação, mais escrutínio, mais dúvidas suscitadas e possivelmente esclarecidas, mais gente a participar e com toda a certeza com um resultado que não poderia ser questionado, pois cada português(a) teria tido a oportunidade de participar e dar a sua opinião.

Até porque no debate que se centrou muito na bolha política, muitas questões foram mal apresentadas e deficientemente explicadas. Saliento que já existem, actualmente, muitas circunstâncias legalmente previstas, que possibilitam a decisão do próprio sobre os tratamentos que quer, ou não, receber em fase avançada de doença, designadamente através das directivas antecipadas de vontade ou da desprescrição médica.

Além disso, referir que, através da rede nacional de cuidados paliativos, embora ainda muito deficitária na sua abrangência nacional, é possível uma abordagem mais atempada sobre a dor e outros sintomas causadores de intenso sofrimento físico e psicológico que, sabemos, são tantas vezes o mote para o desejo por uma solução irreversível. No entanto, por agora, vamos esperar pela análise, e decisão, do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, numa lei que já foi vetada duas vezes.