Opinião
Fazer cidade no Séc. XXI
As cidades mais humanas, com mais qualidade de vida e mais valorizadas são as que conseguem manter a habitação, o comércio e os serviços integrados em centralidades urbanas
Até aos anos 60 do séc. XX, Leiria era um centro urbano denso, contínuo e claramente delimitado. Nesse centro urbano integravam-se com proximidade a habitação, o comércio, os escritórios, as escolas, os templos, os cafés, o hospital, o tribunal, o teatro, o jardim, os campos de jogos e outras funções. Os habitantes e os visitantes da cidade podiam aceder facilmente a pé às diversas funções urbanas.
Como explica A. Moreira de Figueiredo, no seu trabalho “Leiria Tamanho e Desenho”, a partir dos anos 70 “Leiria (...) iniciava um ciclo de desenvolvimento com base no crescimento urbano (...)” Foi também a partir dessa época que o uso generalizado do automóvel veio possibilitar o surgimento fora do centro urbano de zonas isoladas de habitação, de comércio ou de serviços que eram ligadas apenas por estradas.
Como sucedeu na maioria das cidades, os habitantes de Leiria, passaram a deslocar-se cada vez mais de automóvel no seu quotidiano: para levar os filhos à escola, irem aos seus locais de trabalho, irem às compras, acederem aos serviços, voltar à escola no final da tarde a buscar os filhos, regressar a casa, irem ao ginásio, irem a um restaurante, irem ao centro histórico.
O automóvel proporcionou, inicialmente, uma liberdade quase ilimitada de circular e ocupar o território. Mas, com o crescimento da cidade, as deslocações de automóvel que cada habitante necessita de fazer diariamente multiplicadas pelo número crescente de habitantes vão tornando a circulação da cidade cada vez mais lenta e ineficaz. Sendo ainda necessário ocupar a quase totalidade do espaço público urbano com estradas e estacionamentos e consumir muita energia e tempo em deslocações.
Agora no séc. XXI, verifica-se que afinal as cidades mais humanas, com mais qualidade de vida e mais valorizadas são as conseguem manter a habitação, o comércio e os serviços cuidadosamente integrados em centralidades urbanas. Cidades onde os habitantes podem dispensar parcialmente o automóvel no seu quotidiano, onde há espaço para espaços públicos seguros e confortáveis, onde é possível criar uma rede de transportes públicos eficaz.
Como estas cidades, Leiria deve crescer integrando com proximidade as diversas funções em novas centralidades urbanas e não comprometer o seu bom desenvolvimento seguindo o ultrapassado modelo da cidade segregada.