Opinião
Férias, outra vez
Que sejam belíssimas todas as pequenas ou grandes férias que se vivam por aí! Mas que sejam, sobretudo, um feliz encontro com a parte mais natural de nós
E eis que chegam as férias, do modo como sempre chegaram todas as férias.
Como de costume, esperamos um tempo mágico, seja ele passado onde for, porque a palavra que o designa está carregada de memórias, de projecções, e da vontade do mergulho que gostamos de dar em nós, quando livres do que nos amarra a um específico e obrigatório modo de estar.
Nas férias, encontramos aquela outra parte de quem somos que vive mais ou menos escondida o ano inteiro e anseia pela tranquila, ou agitada, liberdade de que necessita para reaparecer.
Serão a areia e o mar, a caruma e a manta no chão, a montanha e o rio, o alpendre e a relva, o rebanho e o milho alto; serão as conversas e os silêncios, o livro e a música, o pensamento à solta e a contemplação; será o grupo ou a solidão, a aventura ou o reencontro; serão os que amamos muito, mas de quem vivemos longe, será a família próxima, ou serão os amigos do ano inteiro; será no lugar de sempre, ou visitaremos um outro lugar.
Esses modos de ser e de estar, ou outros quaisquer, servirão de casulo para a desejada e merecida transformação que nos fará reencontrar essa nossa tão antiga liberdade, começada com sandálias, chapéu, lanches ao sol, e adormeceres embalados pelo estridular das cigarras e dos grilos.
A liberdade que prolonga as horas, reduz as obrigações, e liberta o corpo do movimento do quotidiano para o deixar particularmente atento às sensações.
A liberdade que nos permite escolher apenas entre as coisas simples, apenas entre as coisas importantes.
A liberdade que nos deixa sentir o lento passar das horas e que assim faz suspender o por vezes tão rápido passar do Tempo.
Sei que este ano não haverá férias para muitos.
O longo tempo de inactividade imposta pela pandemia obriga a que se aproveite agora tudo o que for possível aproveitar em áreas profissionais depauperadas.
Será essa mais uma dificuldade a ultrapassar, não pela falta de descanso, mas porque as férias promovem um estado de espírito reconstructor precioso para o recomeço, mesmo que passadas quase sem sair do lugar onde se vive todo o ano.
As férias permitem que se sinta depois o entusiasmo de voltar, a motivação para construir, modificar, ou criar, e a força renovada para enfrentar o que possa não acontecer tal como desejado.
Que sejam belíssimas todas as pequenas ou grandes férias que se vivam por aí! Mas que sejam, sobretudo, um feliz encontro com a parte mais natural de nós.