Opinião
Inabilidade política
Lendo-se o parecer técnico de departamento de Planeamento e Reabilitação Urbana da Câmara, percebe-se que falta um estudo aprofundado que permita antecipar as consequências das propostas.
O vereador Lino Pereira teve uma semana para esquecer. Depois de “crucificado” na imprensa e nas redes sociais pelo abate de quatro dezenas de laranjeiras no Largo Candido dos Reis (Terreiro), viu-se a perder o pé no mar de críticas que inundou apresentação pública das propostas do plano de mobilidade de Leiria.
Mais uma vez, mostrou alguma inabilidade política, bem patente na forma como tem comunicado as decisões dos seus pelouros e na precipitação com que aborda alguns assuntos. A polémica começou, no entanto, bem antes da iniciativa promovida pela Câmara, onde um auditório lotado fazia antever que a cidade não está disposta a passar um cheque em branco nesta questão, eventualmente ainda traumatizada com as experiências do estádio e do Centro Cívico, entre outras.
Era sabido que o parecer dos técnicos da Câmara às propostas era negativo em diversas questões, para não dizer arrasador, o que fragilizou de antemão a apresentação pública. Face a esse parecer, Lino Pereira, com a equipa que a autarquia contratou, deveria ter reflectido e repensado as propostas antes de as apresentar, evitando, assim, a polémica e a contestação que já se geraram à volta desta questão tão sensível para o futuro da cidade e para a qualidade de vida de quem a habita e frequenta.
Sem colocar minimamente em questão a necessidade de se repensar a mobilidade no centro da cidade, visto que Leiria é, nessa matéria, uma cidade ultrapassada e com problemas vários, a verdade é que o processo parece ter sido tratado com uma ligeireza pouco coadunante com a sua importância e impactos futuros.
Lendo-se o parecer técnico de departamento de Planeamento e Reabilitação Urbana da Câmara, percebe-se que falta um estudo aprofundado que permita antecipar as consequências das propostas, sendo que, à primeira vista, algumas não fazem qualquer sentido.
Ou seja, há, sem dúvida, o mérito e a coragem de se tentar alterar a forma como a cidade se relaciona com os carros e com as pessoas, desafio que Leiria abraça com muitos anos de atraso. Um atraso que permite que não haja zonas pedonais, que tenhamos bairros residenciais transformados em parques de estacionamento, que fomenta o uso do automóvel, que tenhamos um espaço público pobre e descaracterizado.
No entanto, a tal inabilidade política de Lino Pereira foi inimiga da sua vontade de fazer, dando margem para que a globalidade do projecto seja posta em causa e para que tudo fique na mesma, o que também não trará nada de bom.
É sabido que em matérias sensíveis, como a que está em causa, nunca se conseguirá agradar a todas as cabeças e que se se estiver à espera de unanimidades nunca nada será mudado. Terá de ser uma decisão política a sobrepor-se às inúmeras opiniões que há sobre o assunto.
É fundamental, no entanto, que essa decisão, em princípio inerente a uma estratégia para a cidade, seja sustentada em pareceres técnicos sérios, rigorosos e bem fundamentados. De outra forma, qualquer decisão política terá pés de barro e só servirá para gerar polémica e contestação. Só levará também a que se voltem a cometer erros como os que estamos a pagar bem caro.
*director