Opinião

Letras | Sobre a poesia

11 abr 2023 17:40

Há palavras quase impossíveis de definir. Poesia – como o amor – é uma delas

Entalado entre o Dia da Poesia, em 21 de março e o festival Ronda Poética que terá lugar aqui por Leiria nos próximos dias 21 a 25, este meu texto não poderia senão falar de poesia.

A história da poesia é anterior à história da escrita. “A origem da poesia se confunde com a origem da própria linguagem. Talvez fizesse mais sentido perguntar quando a linguagem verbal deixou de ser poesia”, diz Arnaldo Antunes, poeta e cantor brasileiro.

Os primeiros registos foram encontrados em monólitos, pedras rúnicas (oráculos) das primeiras culturas que já utilizavam a escrita. Foi a forma de expressão utilizada em obras antigas, livros sagrados, tais como os Vedas indianos (1700–1200) e os Gathas de Zoroastro (1200–900 a.C.). Há também registos de poemas em hieróglifos egípcios de muitos séculos a.C.

A poesia como a fomos conhecendo ao longo dos séculos no mundo ocidental teve origem na Antiga Grécia com a criação da escrita por volta do século VIII A.C., aceitando-se ter sido Homero o primeiro poeta grego, ao qual foi atribuído o registo dos dois grandes poemas épicos – a Ilíada e a Odisseia. E falo em registo porque sabemos que essa primeira poesia era transmitida de geração a geração por uma tradição oral, reunindo uma coleção de poemas, cantados ou recitados em tornaocasiões especiais.

É na “República” de Platão e na “Poética” de Aristóteles, textos doutrinários, que podemos ir beber sobre os primórdios e as particularidades poéticas da epopeia e da tragédia, géneros de estilo elevado destinados a um público culto. Da comédia, que, segundo Aristóteles, nasceu de poetas “de mais baixas inclinações que se voltaram para as ações ignóbeis compondo vitupérios”, pouco se ficou a saber já que o seu Livro II “Teoria da fabulação cómica” não chegou à atualidade.

A poesia lírica, que foi a que prevaleceu desde o Renascimento, teve também origem helénica e talvez seja a poetisa Safo de Lesbos a sua mais conhecida criadora. A definição de poesia lírica literária é, segundo Carlos Reis, muito problemática. Trata-se de “um processo em si muito complexo, multifacetado” e de conceção muito diversa: “pode ser encarado como ato epifânico, como devaneio, como sonho, como resultado da inspiração, como labor tecnicamente fundado, etc.”

Eça, pela voz de Fradique Mendes, diz: “A Poesia não se inventou para cantar o Amor. Ela nasceu com a necessidade de celebrar magnificamente os deuses, e de conservar na memória, pela sedução do ritmo, as leis da tribo. A Poesia tendeu sempre, e tenderá constantemente a resumir, nos conceitos mais puros, mais belos e mais concisos, as ideias que interessam e conduzem os homens.” Shelley, na sua Defesa da Poesia, escreve: “um poema é a própria imagem da vida expressa na sua verdade eterna”; [a poesia] “é sempre e ainda a luz da vida; a origem de quanto é belo, ou generoso, ou verdadeiro que pode ter lugar numa época maldita.” “Ser poeta é apreender o verdadeiro e o belo” [e] “a verdade e o esplendor da sua imagística e a melodia da sua linguagem são do que mais veemente que conceber se possa.” Há palavras quase impossíveis de definir. Poesia – como o amor – é uma delas.