Opinião

Letras | Uma Mulher Aparentemente Viva, Cláudia R. Sampaio

21 jul 2022 11:25

Desenvolve-se em onze capítulos onde a Mulher, a Poeta “dialogam” com o Leitor, que será ele também um espelho ou assistente para sua própria ponderação

É uma poeta e pintora nascida em Lisboa já contando seis livros. Entre eles, Já não me deito em pose de morrer, Outro nome para a solidão ou o raríssimo A primeira urina da manhã.

É artista residente do projecto Manicómio. Tem uma escrita ímpar e uma visão do mundo tão particular como urgentemente familiar.

Basta sabermos olhar para dentro e buscar-nos nas vicissitudes do pensamento. Desde que busquemos conhecer até nas próprias vergonhas quotidianas. Desde que tomei conhecimento da obra de Cláudia R. Sampaio (CRS), e numa crescente odisseia naquilo que é o universo poético em oposto à contracção de tudo o quanto conheci (e que aos poucos vai deixando de ter uso) mudou também a minha visão em relação a coisas de capital importância na vida. O universo feminino e a vastidão/complexidade dos pensamentos e emoções, a solidão, a doença mental, as pessoas em particular. Uma mulher que escreve como poeta a profundidade do ser e da alma até ao ínfimo pormenor dessas mesmas vergonhas humanas/intimidade do ser no seu quotidiano. Como se ambas coexistissem.

Numa escrita feminina, da mulher e do Eu, ela explora mais além aquilo que acaba por nos afectar a todos como seres humanos. Pode até se transformar masculina, em campo ou lírio, para nos fazer entender o que é uma mulher e essa complexidade da vivência feminina.

As primeiras páginas deste seu novo livro são preenchidas com as suas pinturas, ou numa outra forma de dizer, a sua poesia visual, imagética. Desenvolve-se em onze capítulos onde a Mulher, a Poeta “dialogam” com o Leitor, que será ele também um espelho ou assistente para sua própria ponderação nos temas da mulher lúcida e do seu oposto, da mulher e a solidão, da assunção do Eu e da dignidade, de quem somos se não tivermos ninguém.

É um exercício vivo da luta e de como a poesia pode vencer no final, nem que seja por aceitarmos que “por agora estamos vivos”, o que em si é um crédito poderoso para o amanhã nestes tempos de grande incerteza.