Editorial
Mais um desafio para a Justiça
A lei nem sempre é garantia de justiça e por isso se tem reclamado tanto a reforma do sistema judicial
O artigo dedicado ao princípio da igualdade, na nossa Constituição, é taxativo: “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”.
E, salvo raras excepções, quem acompanha minimamente o funcionamento dos tribunais reconhecerá que o respeito por esta parte dos direitos fundamentais restituídos depois do 25 de Abril de 1974 tem sido a prioridade dos principais protagonistas do sistema judicial.
Mas é preciso não esquecer que todos eles têm o dever de cumprir escrupulosamente com o que está estipulado no quadro legislativo.
E que podem esbarrar em lacunas normativas, ou ver-se envolvidos em processos cada vez mais complexos, fruto de um Estado de direito em evolução.
Se afunilarmos isto à nossa região, basta recordarmos casos como o primeiro megaprocesso das facturas falsas em Leiria, o desfecho do processo da rapariga que provocou a morte ao namorado depois de o atingir propositadamente com ácido sulfúrico, ou o julgamento do processo Passerelle, que se estendeu por meses e meses de sessões e obrigou à colocação de armários suplementares na sala de audiências para que os densos volumes com as provas recolhidas pela acusação estivessem mais à mão.
Mais tarde, foram criadas novas salas de audiência no Tribunal Judicial, a sala principal foi modificada para permitir a presença de mais arguidos e advogados (mesmo assim já foi necessário recorrer a auditórios externos face à elevada quantidade de acusados e defensores envolvidos no processo), e os magistrados continuaram a desempenhar a sua missão: aplicar a lei.
Ressalva: a lei nem sempre é garantia de justiça e por isso se tem reclamado tanto a reforma do sistema judicial.
Afunilando ainda mais, atentemos no caso que vos contamos esta semana, de um jovem com paralisia cerebral, que resolveu processar o Estado por entender que os seus interesses não foram protegidos quando ficou sem pai e mãe, aos oito anos.
O processo entrou no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF), o juiz entendeu que a lei não lhe conferia competência para deliberar, e a acção transitou para o Juízo Cível. Após contestação do Ministério Público, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça apelou ao Tribunal dos Conflitos para analisar caso e o processo regressou ao TAF.
O equivalente a dizer que voltou à estaca zero.
Este é, sem dúvida, mais um caso peculiar e um novo desafio para a nossa Justiça, já que o seu desfecho pode ditar um novo caminho na defesa do superior interesse dos menores