Opinião

Marketeer a dias | Quem faz um “filho”, fá-lo por gosto

30 jan 2023 20:00

O “produto” que gerámos até pode sofrer uma ou várias evoluções ao longo da vida. Uma metamorfose, até. Mas a constelação de valores, que nele ficam gravados e pelos quais se rege, é imutável

Lembram-se da história do Pinóquio? Esqueçam a parte do nariz que cresce a cada mentira. Foquem-se em como este foi gerado: um carpinteiro, Gepeto, queria tanto ser pai que acabou por construir o seu filho em madeira, esculpindo-o com o “amor incondicional” que acabou por lhe dar vida!

É com esta imagem que vos consigo explicar por que é que lançar um produto no mercado é algo muito próximo de “pôr um filho ao mundo”. Não basta gerar. É preciso amar, supervisionar e reajustar, certos de que vai haver chatice(s), a dada altura.

Perceber isto não foi acaso. Foi fruto de acontecimentos recentes: uma das “minhas pessoas” foi mãe pela primeira vez há dias, e a adrenalina do nascimento desencadeia em nós uma série de reflexões. Calha ela ter formação em marketing, e não só, e ainda assim não saber (mas sonhar) a dimensão que o seu “produto”, acabado de gerar, alcançará. É que o coração de mãe é como um humilde T0, que se amplia e divide até virar mansão! E cada filho seu será, talvez, o único produto sem substituto possível no mercado. O seu valor é tão inestimável quanto crescente ao longo de todo o seu ciclo de vida: desde a gestação ao nascimento, do crescimento à maturidade. Podem os olhos de uma mãe ter a sorte de ver um filho chegar à velhice, mas nem as cataratas toldarão o valor que esta lhe atribui, como relíquia que se guarda na caixa de jóias da família. O mais delicado brinco. O mais forte cordão de ouro. Há todo um legado que se transmite na relação simbiótica que se vai gerando entre mãe e filho, que a recém-nascida mãe só a pouco e pouco poderá tomar consciência da obra-prima adimensional que lançou ao mundo, a partir de si e do seu par. Nem toda a gente estará disposta a “comprar” este seu valioso produto, permanentemente inacabado. Mas quem o fizer, levará também um pouco de si, do ser que o gerou.

É que um filho é um ser vivo. Um diamante em bruto, dotado de calibre próprio. Depois, e só depois, é polido pela força das circunstâncias, da família e do social, que o moldam e ensinam a encaixar numa jóia, sob pena de se perder na tentativa de brilhar a solo. Somos seres sociais: ou pertencemos, ou sucumbimos.

Já um produto é um ser inanimado. Cabe a nós, marketeers, dotá-lo de vida! É isso mesmo: o marketing também gera Pinóquio´s (produtos/marcas) que encaixarão em jóias de valor - este, estimável - a que designamos de “indústria” e “mercado”. Da Inovação e Desenvolvimento (gestação) à Introdução no Mercado (nascimento), do Crescimento (infância e juventude) e Maturidade (idade adulta) até chegar ao Declínio (velhice), o produto pode e deve estar sujeito à evolução. Escolhi a palavra “sujeito”, e não “à mercê”, propositadamente. Pois tal como os filhos-gente, os filhos do marketing podem ser magistralmente lapidados de acordo com o que os rodeia. Desde as suas características primárias (como a forma, cor, dimensão e apresentação), até ao seu caráter e personalidade (essenciais à sua identidade, diferenciação e posicionamento). Desde que nascem até ao seu último fôlego de vida, sendo certo que no seu percurso de vida terão atraído uns, em detrimento de outros; servido as necessidades de uns, precisamente por serem inúteis para outros.

Neste processo evolutivo - que me calhou em sorte conhecer enquanto mãe e profissional - encontro, felizmente, um eixo. O “produto” que gerámos até pode sofrer uma ou várias evoluções ao longo da vida. Uma metamorfose, até. Mas a constelação de valores, que nele ficam gravados e pelos quais se rege, é imutável. Determina o seu propósito de vida e a dimensão do seu ciclo de vida.

Ogilvy dizia: “Excelente marketing num produto medíocre só o faz cair mais rapidamente.” Ser pai ou mãe é uma grande responsabilidade. E um gosto! Não se esqueçam de se divertir enquanto trabalham.