Opinião
Mudar de rumo - O mau Governo
"(...) no caso português, os erros e as omissões foram de tal ordem que conduziram Portugal a ter de pedir por três vezes ajuda externa, o que representa uma grave confissão de incompetência"
Em Portugal os maus governos têm sido uma constante desde a eleição de Cavaco Silva como Primeiro Ministro, porque apesar de todos terem feito coisas acertadas e dentro dos padrões normais da governação, são os erros e as omissões graves que fazem a diferença e que nos atrasam relativamente aos outros povos. De facto, no caso português, os erros e as omissões foram de tal ordem que conduziram Portugal a ter de pedir por três vezes ajuda externa, o que representa uma grave confissão de incompetência. Com a nota de que nenhum primeiro ministro aceitou que a culpa seria do seu governo e todos acusaram os governos anteriores, quando de facto todos foram maus governos e na generalidade fizeram o contrário do que deviam.
A omissão mais grave foi a inexistência de uma estratégia nacional consensualizada com a sociedade, que retirou sentido de direcção à governação dos últimos trinta anos, o que, por sua vez, foi o resultado de nenhum primeiro ministro português, desse período, ter dimensão de estadista, o que normalmente se caracteriza por governar para o futuro. De facto, durante este período, a generalidade das decisões governativas foram a cópia de modelos estrangeiros do passado ou assumidas pela pressão dos acontecimentos internos e externos, estes com origem na União Europeia, decisões frequentemente desadequadas à realidade portuguesa.
Para compreender esta realidade basta perguntar que marca distintiva e positiva foi deixada pelos governos depois da adesão à União Europeia, por exemplo, semelhante à deixada por Veiga Simão, um estadista, através da reforma do ensino no Governo de Marcelo Caetano? Recordo-me apenas de Luís Mira Amaral como Ministro da Indústria, um grande ministro, que não se deixou influenciar pelas directivas europeias e teve a visão suficiente para criar um futuro à indústria portuguesa, tendo para isso que resistir a Cavaco Silva.
A lista dos erros é extensa e talvez se justifique a sua enumeração para se compreender melhor aquilo de que estamos a falar e a sua influência no atraso português, que sucessivos governos não souberam vencer, erros que começaram com as nacionalizações no período anterior. Recordemos alguns:
1- As privatizações feitas a baixo preço, para reforçar os grupos económicos nacionais, iniciou um sistema de privilégio aos sectores de bens não transaccionáveis no mercado interno, reduzindo o necessário ímpeto para a exportação iniciado no período da EFTA. Tratou-se de um erro que ainda hoje penaliza a economia portuguesa, por via das rendas pagas a algumas dessas empresas, mais isenções fiscais e apoios diversos, tudo com repercussão na competitividade dos sectores de bens transaccionáveis e exportadores, através do aumento dos seus custos em energia, telecomunicações, impostos e gastos financeiros.
2- A obsessão com as obras públicas, iniciada por Cavaco Silva, afectou todos os governos até ao actual Governo PSD/CDS, obras feitas sem qualquer estratégia económica, que criaram uma indústria de construção sobredimensionada e insustentável, que esteve na origem do desemprego actualmente existente e do endividamento externo. Como parte desse desvario desenvolvimentista está a construção destinada à habitação e a política de solos, que permitiu que a especulação dos terrenos na periferia das cidades descambasse em corrupção, à custa do abandono dos centros históricos das nossas cidades. O que poderia e deveria ter sido evitado através da penalização fiscal das mais valias resultantes, como acontece noutros países.
3 - A preferência pelo transporte rodoviário privado, em vez da mobilidade pela via do transporte colectivo ferroviário, foi outro erro, com efeitos negativos na competitividade da economia portuguesa por várias razões: aumentou enormemente o consumo de combustíveis fosseis importados e a poluição atmosférica; criou um custo elevado na balança de pagamentos através da importação de automóveis, quando ao tempo a ferrovia tinha uma elevada incorporação nacional; facilitou a mobilidade interna e o mercado interno e prejudicou a mobilidade externa e as exportações.
Na próxima edição continuaremos a enumeração dos erros governamentais que nos conduziram à actual crise e, a propósito, gostaria que eventuais defensores dos governos viessem, sustentadamente, contrariar os factos que aqui descrevo.
Empresário