Opinião
Música | Socializar e escutar
Sim, esgotar festivais dinamiza a economia, cria e prolonga emprego
Na última recessão e auge da troika, nunca mais me esquecerei de um senhor à porta de um festival na Figueira da Foz a vociferar que “para isto já há dinheiro”, esquecendo-se por completo que vai quem quer, toma a decisão quem pode e prioriza quem deve.
Outro dado que seria impossível de medir ali “à boca da urna” eram precisamente os que não foram porque – lá está – não tinham dinheiro para ir e até gostariam.
São este tipo de visões simplistas traduzidas quase para calão que ainda muita gente se baseia para olhar em seu redor e que simplesmente não consegue conceber modos diferentes que não o seu.
A intolerância disfarçada circula por aí, basta ver a rede social do JORNAL DE LEIRIA quando se falam em questões (ainda) fraturantes.
Assim, alojamento, deslocações e alimentação foram os principais gastos dos turistas que se deslocaram ao festival Primavera Sound, no Porto, com um impacto de 36 milhões de euros. Só no recinto, por dia, os festivaleiros deixaram cerca de 100 mil euros.
Sim, esgotar festivais dinamiza a economia, cria e prolonga emprego, ou seja, deixa rasto, assim demonstrou um estudo realizado pelo ISAG - European Business School e pelo Centro de Investigação em Ciências Empresariais e Turismo da Fundação Consuelo Vieira da Costa, no Porto.
Este ano – época de regresso e reencontros entre festivaleiros que habitualmente se separavam de um ano para o outro, mas que agora muitos não se viam desde 2019 – há um fator (já e sobejamente presente) mas agora exponenciado a mil: a socialização.
A juntar aos reencontros há os novos públicos (independentemente das idades) que decidiram juntar-se aos já existentes e frequentar um festival da sua preferência.
Numa época de pós-confinamentos era de esperar. Mas também acaba de entrar este ano uma nova geração, que tinha 15 anos em 2019 e tem agora 18 marcando presença, com todas as dores de crescimento que fazem parte, como a estupefação de um jovem norte-americano – na fila para o WC – claramente confuso pela negritude do artista Nick Cave e que ainda estava a processar o que tinha acabado de presenciar.
Mas será que esse lado social se irá sobrepor ao fator musical, diferenciado, que ainda muitos festivais tentam ter? No passado assistimos à massificação dos festivais de verão, e depois houve uma espécie de indefinição em alguns cartazes pois o que interessava era só entreter e se sobrasse tempo naquela feira temática, aí sim, ainda se iria ver um concerto ou outro.
Espero que a escolha, independentemente dos estilos, continue ponderada (em alguns casos até formativa) e não crie um monstro temático apenas com uma banda sonora de fundo. Ainda há gente que vai pela música e isso nunca impediu o resto.