Opinião

Música | Versos melodiosos de uma qualquer poesia indecifrável

6 nov 2022 21:32

Provenance é um disco que nutre a imensa nostalgia que todos vós apreciarão, despontando frequentemente em momentos de frágil doçura e sóbria melancolia

Nascido na antiga República Democrática Alemã, na primeira metade da década de 80, o músico e compositor que hoje vos trago chama-se Tim Linghaus. Conta-nos ele que foram os encontros fortuitos com um teclado da Yamaha, o RX 11 (uma máquina de ritmos) e umas guitarras no escritório de seu pai, que nele cedo despertaram a vontade de tocar e também de compor. Isto porque o seu pai, pese embora não vivesse ou viva profissionalmente da música, havia integrado vários projetos musicais quando era jovem e foi, paulatinamente, construindo um estúdio em casa e registando de ora em vez, composições suas.

Tim aproveitou o embalo, participava até, naturalmente, das criações de seu pai, e cresceu nesse ambiente de grande estímulo musical, bebendo das influências que por ali se escutavam. Curiosamente, e apesar de muitas vezes se sentir especialmente atraído por um outro instrumento – pelo piano vertical que também cedo encontrara em casa do seu avô –, o agora experiente compositor e conhecido, sobretudo, pelo seu trabalho ao piano, fez também parte de várias bandas nos primeiros anos da sua juventude mas tendo sempre a guitarra como seu principal instrumento. Ainda assim, o gosto pelo piano prevaleceu, e Tim rapidamente começa a materializar este seu já mais do que evidente gosto pela composição.

Em Novembro de 2016 lança o EP Vhoir, com o selo da editora Moderna Records, seguido pouco depois pelo álbum de estreia em longa-duração Memory Sketches, pelas mãos de Schole Records/1631 Recordings, em Março de 2018. Será, todavia, do mais recente Provenance que hoje vos falo, editado no início deste ano, também pela 1631 Recordings (editora que surge da cabeça de David Wenngren, em 2015, com o intuito de fornecer música dentro do género neoclássico para possíveis sincronizações com imagem).

São 13 as peças para piano solo a descobrir neste reconfortante disco, caminhando tranquilamente – dentro de uma perspectiva estética – no ombro de gigantes (nomes que rapidamente reconhecemos no universo neoclássico) como o incontornável Yann Tiersen, o (quase) oscarizado Dustin O'Halloran, a sublime Olivia Belli ou o cada vez mais popular Simeon Walker, alguns dos exemplos com quem este jovem compositor se sentirá, certamente, bem acompanhado. É um disco que nutre a imensa nostalgia que todos vós apreciarão, despontando frequentemente em momentos de frágil doçura e sóbria melancolia; versos melodiosos de uma qualquer poesia indecifrável, que nos contagiam – sobretudo – pela lucidez da harmonia e pelo espaço confrangedor entre as notas.

Tim contribuiu já para imensas listas de reprodução de música neoclássica e projectos de recriação/reinterpretação de obras de alguns outros autores e editoras, como para o já referido britânico Simeon Walker, o sueco Vargkvint ou a editora londrina Bigo & Twigetti.

Uma bela companhia, este Provenance, para o Outono que já se instalou.