Opinião
O crime compensa
Sem qualquer pejo, por preguiça, desmazelo ou por dinheiro, poluem rios, oceanos, terrenos agrícolas, espaço público urbano e o próprio ar que respiramos.
Os crimes são muitos, as penas quase zero. É este o retrato da relação com o ambiente em Portugal, mesmo havendo plena consciência sobre as consequências que o desrespeito pela natureza tem na vida das pessoas e na sustentabilidade do próprio Planeta.
Ou seja, apesar de estarmos já a sofrer as represálias pela afronta à natureza, manifestadas das mais variadas formas, desde secas extremas até problemas na camada de ozono, continua a haver quem coloque outras prioridades à frente da preservação do que temos e que é essencial para existirmos.
São pessoas para quem tudo o que está para lá dos seus muros pode servir de lixeira e de local de despejo, sejam dejectos de animais, resíduos e gases industriais, velharias ou mesmo ruído. Sem qualquer pejo, por preguiça, desmazelo ou por dinheiro, poluem rios, oceanos, terrenos agrícolas, espaço público urbano e o próprio ar que respiramos.
Sendo pouco provável que essas pessoas mudem de mentalidade através de uma sensibilização pedagógica, pois como é habitual dizer-se ‘burro velho não toma ensino’, há que demove-las de outras formas, nomeadamente através da repressão e do castigo.
O problema é que raramente isso acontece, parecendo haver uma aliança entre quem polui e quem deveria fazer justiça nessa área. Como é possível perceber no trabalho que o Jornal de Leiria publica nesta edição, para lá dos inúmeros crimes ambientais que passam incólumes como se nada tivesse acontecido, não chegando sequer a tribunal, quase 50% dos que chegam acabam com absolvições ou simples admoestações.
Tão ou mais incrível, é que quando a culpa é provada, o que é raro, as penas aplicadas são, na esmagadora maioria das vezes, absolutamente ridículas, promovendo a lógica de que o crime compensa.
Se tomarmos como exemplos o caso de uma descarga de efluentes suinícolas que deixou 10 mil pessoas no concelho de Porto de Mós sem água e que, apesar de provada a culpa, terminou em absolvição devido a questões de formalismo do processo, ou, mais recentemente, um outro caso que terminou com uma coima mínima de 24 mil euros que pode ser reduzida para seis mil, apesar de o juiz considerar que houve um atentado ambiental muito grave, facilmente se percebe o nível de impunidade existente nesta área.
Como é óbvio, estando a montante do problema pessoas pouco civilizadas e com défice de escrúpulos, essa impunidade será como que uma passadeira vermelha para que continuem a usar aquilo que é de todos como se das suas retretes privadas se tratasse.
Se isto fosse um guião de um filme de Hollywood, daqueles onde o herói acaba sempre com a amada nos braços, certamente que os vilões se afogariam na merda de porco ou nos químicos industriais com que andaram a infernizar a vida dos outros.
Como estamos fora da sétima arte, confrontados com a realidade nua e crua, continuarão a passear-se nos seus carros de grande cilindrada enquanto se gabam da forma como ganharam dinheiro para os comprar. Para quem sofre, resta sonhar com Hollywood…
*Director