Editorial
O futuro sempre foi incerto, mas agora parece mais
A educação entrou o ano a tentar recuperar a normalidade pós-pandemia e termina com greves por tempo indeterminado, convocadas por um novo movimento sindical
Ainda o ano não tinha completado dois meses, o uso de máscara de protecção individual contra a Covid-19 continuava obrigatório em espaços fechados, e já o mundo estava a ser atingido por um novo golpe. A guerra instalava-se de novo na Europa, mesmo ao lado das fronteiras da União Europeia e da Organização do Tratado do Atlântico Norte, com consequências devastadoras.
O fluxo migratório, o mais rápido desde a II Guerra Mundial, envolveu a deslocação de mais de 3,7 milhões de ucranianos para países terceiros. Portugal colocou-se na linha da frente para enviar ajuda humanitária e acolher refugiados. A região de Leiria organizou-se rapidamente para responder de forma activa ao desafio. O JORNAL DE LEIRIA acompanhou a entrega das primeiras toneladas de bens de primeira necessidade às equipas humanitárias da Ucrânia, enviadas a partir de Leiria, e regressou com o primeiro grupo de pessoas que haviam escolhido a nossa região para fugir ao horror dos combates. Algumas ficaram por cá, outras mudaram-se para novas paragens e outras regressaram ao seu país, apesar de não se vislumbrar um fim próximo para o calar das armas.
Chegava Março e adivinhava-se mais um ano complicado. O País entrava num período de seca, um dos piores do último século, os primeiros impactos do conflito a Leste começavam a reflectir-se com estrondo no preço dos combustíveis, do gás, da energia, das matérias-primas e dos produtos expostos nas prateleiras dos supermercados. Seguia-se o aumento da inflação e das taxas de juro.
Regressava o fantasma da incerteza aos orçamentos familiares e aos planos de investimento das empresas. As dúvidas quanto ao futuro acentuaram-se ao longo do ano e as previsões do Banco de Portugal para 2023 apontam para novas preocupações: a taxa de desemprego pode aumentar de 5,9 para 7,1%, os preços podem voltar a subir 8%. A parte positiva é que as chuvas dos últimos meses ajudaram a recuperar as albufeiras.
Avançando no calendário, o mês de Julho fez-nos reviver, de novo, o inferno dos incêndios. Numa semana, além de habitações e unidades industriais, arderam 15.500 hectares de floresta na nossa região. Voltou a apontar-se o desordenamento, a falta de limpeza e as alterações climatéricas como principais causas da rápida progressão das chamas, um sinal claro de que pouco se aprendeu com o inferno de 2017, no norte do distrito e no Pinhal de Leiria.
Na área da Saúde, foram-se multiplicando as notícias do encerramento temporário de urgências nos centros hospitalares de Leiria e do Oeste ou de tempos de espera superiores a 12 horas. Chegaram-nos relatos de caos em alguns serviços, com as justificações oficiais a alegarem, regra geral, a falta de recursos humanos para completar escalas ou agilizar atendimentos e tratamentos.
Ainda esta semana, o Hospital de Leiria enfrentou problemas na urgência geral e solicitou o encaminhamento de doentes para outras unidades hospitalares. E o Hospital das Caldas da Rainha anunciou o encerramento do bloco de partos para os últimos três dias do ano. Sinais pouco animadores para o ano que se avizinha.
Na Justiça, o ano ficou marcado pela absolvição dos 11 arguidos indiciados pelo Ministério Público como responsáveis pela morte de 63 pessoas nos incêndios de Pedrógão Grande. Desfecho diferente teve o processo de reconstrução das casas destruídas durante os mesmos incêndios, em 2017: os ex-autarcas de Pedrógão Grande, Valdemar Alves (presidente) e Bruno Gomes (vereador), acabaram condenados a penas de sete e seis anos de prisão, respectivamente, pelos crimes de prevaricação de titular de cargo político e burla qualificada. Ambos apresentaram recursos que aguardam decisão.
A educação entrou o ano a tentar recuperar a normalidade pós-pandemia e termina com greves por tempo indeterminado, convocadas por um novo movimento sindical (S.T.O.P.), que reúne pessoal docente e não docente, até agora não sindicalizado, por entender que os sindicatos tradicionais “não têm estado à altura das oportunidades e necessidades de quem trabalha nas escolas”.
Apesar das expectativas elevadas, o sector da Cultura sofreu um revés, em Março, com Leiria a ser afastada da lista de finalistas na corrida a Capital Europeia da Cultura. Ficou a semente da Rede Cultura, constituída por 26 municípios, da qual se esperam novos frutos culturais para o concelho e para a região. Destaque também para os aplaudidos regressos, entre outros, dos festivais A Porta e Extramuralhas, e para a auspiciosa estreia do Nascentes, na aldeia das Fontes, junto à nascente do rio Lis.
Realce ainda para a área económica, com a região a ver aprovadas oito candidaturas às Agendas Mobilizadoras para a Inovação Empresarial, integradas no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), a registar uma autêntica corrida à energia solar (em Abril havia 40 pedidos para centrais fotovoltaicas no distrito) e a assumir uma forte aposta nas energias limpas, com projectos de ponta como o Nazaré Green Hydrogen Valley, um investimento de 100 milhões de euros centrado na produção de hidrogénio verde para abastecimento das indústrias da Nazaré, Marinha Grande e Leiria.
Que o ano de 2023 nos traga boas notícias.