Editorial
Pontapé na educação
Cristiano Ronaldo devia saber a influência que tem em milhões de adeptos da modalidade: os de bancada e os de formação
No futebol, há o pontapé de saída, o pontapé de baliza, o pontapé de canto, e até o pontapé de bicicleta.
No dia-a-dia, utiliza-se com frequência a expressão “pontapé na crise” ou, nos casos mais extremos, o pontapé no traseiro.
No início desta semana, surgiu uma nova definição: o pontapé na braçadeira.
Terminada a partida entre Portugal e Bélgica, que valia o apuramento para os quartos de final no Europeu de Futebol 2020, Cristiano Ronaldo deixou-se vergar pelo peso da derrota.
Enquanto os seus companheiros debitavam o tradicional “temos que levantar a cabeça”, nas entrevistas rápidas, o craque madeirense curvava-se no relvado, cabisbaixo, depois de atirar ao solo a braçadeira de capitão.
Ele sabe, mais do que ninguém, que as lentes o seguem permanentemente e estão sempre prontas a gravar ou a congelar o momento para a posteridade.
Ele sabe, mais do que ninguém, que o simples gesto de afastar duas garrafas de refrigerante, numa conferência de imprensa, tem efeitos mediáticos a nível mundial.
Ele tinha de saber que, naquele dramático final de jogo, era o foco das objectivas. Mesmo assim, vergou-se. Revelou mau perder, ao contrário do restante colectivo.
A caminho do balneário, e depois de ter recuperado a braçadeira, voltou a atirá-la ao chão, pontapeando-a. A imagem preencheu os espaços nobres dos espaços informativos. Correu Mundo.
Cristiano Ronaldo devia saber a influência que tem em milhões de adeptos da modalidade: os de bancada e os de formação.
E devia saber também, enquanto capitão de uma selecção que representa um País, que o seu gesto em nada contribui para dignificar o futebol.
Ainda assim, o detentor de um admirável número de recordes nacionais e mundiais, preferiu reagir de forma intempestiva, contrariando a cartilha das boas práticas do fair play desportivo.
Ao dar um pontapé na braçadeira, CR7 deu também um valente pontapé na (falta de) educação.
Mais valia ter dado um pontapé na gramática, pois assim, mais meme menos meme na internet, seria um deslize fácil de justificar perante as camadas mais jovens, aquelas que hoje o vêem como um ídolo e que mais tarde o vão querer imitar.