Opinião

Qualificar à sorte

6 ago 2021 15:45

Pacotes de formação de 25 ou 50 horas não (re)qualificam um trabalhador. Ocupam-no e permitem às empresas ter documentação de formação em dia

Por entre as economias mais robustas da Europa – a que chamamos também países ricos - gostaria de sublinhar um traço comum que merece certamente reflexão no panorama do ensino e formação profissional.  Estes exemplos alinham um padrão que merece reflexão. A média da taxa de empregabilidade destes alunos na UE é de 79,1%, sendo de 88% no caso da Áustria, 80,4% da Finlândia, 90,4% nos Países Baixos e 76% em Portugal.

Entre os melhores sistemas educacionais do mundo e em economias bem desenvolvidas, encontramos uma constante.

O sucesso passará por muitas outras variantes, é certo, mas não deixa de ser esmagador o peso que os percursos científico-humanísticos têm na vida activa dos jovens em Portugal, cuja empregabilidade deixa muito a desejar, frustrando carreiras, desejos e investimento das famílias, e cujas competências técnicas e práticas não são imediatas mais valias para sectores como a indústria, pois necessitam de formação acrescida no local de trabalho.

É unânime esta queixa por entre os empregadores, falta mão-de-obra qualificada. E com isto pedem-se técnicos, não necessariamente doutorados e especialistas de grau académico superior.

A mistura que se faz entre as necessidades do mercado, e aquilo que é o desenvolvimento e a oferta dos recursos que o Estado precisa de promover, só tem coincidência em casos de sorte.

Quando se fala em formação – e vem aí um PRR cheio de verbas para formação - era preciso abandonar preconceitos, apostar a sério no que é preciso e ter coragem para abanar o sistema.

Quando vemos os pacotes de formação gratuita que por aí andam (que é toda financiada, não há nada de gratuito nisso), ocupam áreas insipientes de necessidades.

Pacotes de formação de 25 ou 50 horas não (re)qualificam um trabalhador. Ocupam-no e permitem às empresas ter documentação de formação em dia perante entidades que verificam apenas e só isso mesmo, se o papel existe e tem validade.

Dificilmente iremos (re)qualificar um soldador, um encarregado, um operador de máquinas CNC, um técnico de construção, com essas horas de formação, muitas vezes ministradas por formadores que nunca viram uma empresa.

Há exemplos muito interessantes e eficazes, no seio de muitas empresas, de qualificação profissional. Alguns cá, mas sobretudo na Europa.

Mas que é talhada à medida de cada um dos trabalhadores que necessitam dessa qualificação, é feita a sério. E as empresas pagam.

Cá temos o pior de todos os mundos. Os trabalhadores beneficiam de ofertas de formação gratuita, não específica (alguns até vão contrariados), as empresas veêm nisso pouco benefício e ainda têm que pagar muito quando querem apostar num trabalhador a sério.

Entre as palavras elogiosas do papel da formação e qualificação profissional e aquilo que é a actuação dos organismos do Estado… neste país é uma questão de sorte.