Entrevista

Carlos Guerra: “Pedrógão Grande tem de ficar na memória como exemplo, para não se repetir”

10 dez 2020 10:36

Comandante Operacional Distrital de Leiria desde 2018, lamenta que o processo sobre o incêndio de Pedrógão Grande tenha deixado de fora todos os elementos responsáveis nesta área, desde a cúpula. Para este comandante, o fogo de 2017 nunca poderá ser esquecido, para que os decisores não deixem que uma tragédia destas se volte a repetir

Carlos Guerra é comandante distrital desde 2018
Ricardo Graça

Leia a segunda parte da entrevista aqui.

Que mudanças se verificaram nos protocolos de socorro desde que surgiu a pandemia?
A pandemia obrigou-nos a novos protocolos no que diz respeito à emergência médica. A maioria dos corpos de bombeiros tratavam qualquer caso como suspeito. Foi muito difícil quando percebemos que tínhamos de ter equipamentos de protecção individual [EPI] para tudo e não havia. A autoridade tentou, dentro das possibilidades, dar EPI e temos feito distribuições quinzenais. Houve uma aprendizagem constante das medidas de auto-protecção: o uso da máscara, a desinfecção, o distanciamento social. A preocupação hoje é colocar de imediato uma máscara na vítima e só lhe tocar depois. Tivemos casos de infectados por contactos com vítimas. Não é possível impedir o contágio. Aqui [Comando Distrital de Operações de Socorro] temos medição da temperatura, desinfecção das mãos e distanciamento social dentro do possível e tivemos dois casos.

Que balanço faz da época de incêndios deste ano, em convivência com a pandemia?
O contexto inicial era difícil, porque íamos ter dois problemas: combater os incêndios e a pandemia. Conseguimos. Não se pode avaliar se ardeu mais ou menos. Tivemos cerca de 1600 hectares de área ardida, resultante sobretudo dos dois grandes incêndios nas Serras de Aire e Candeeiros. Mas é preciso realçar que tivemos capacidade de mobilização inicial. Cerca de 97% dos incêndios foram debelados na primeira hora. Isto demonstra a nossa capacidade de ataque inicial, sustentada nos corpos de bombeiros, GNR e nas equipas de sapadores florestais. O ataque inicial terrestre e aéreo está cimentado e devidamente consolidado e é uma doutrina que jamais vamos perder.

O que correu menos bem?
Aquilo que corre menos bem há dez ou 20 anos: o desordenamento que a floresta apresenta, a falta do proprietário florestal e a incapacidade que temos tido, todos, de resolver os problemas antes do Verão. Pensamos de mais no combate e de menos na prevenção. Temos de inverter isto e, sobretudo, as mentalidades. Temos de começar a investir muito na prevenção, o que inclui acções de fogo controlado, o ordenamento florestal, a formação e o treino dos nossos operacionais e os EPI. A gestão de combustível tem de ser feita no Inverno. Temos de começar a queimar hoje o que não queremos que arda no Verão. Já fiz muita pressão junto do ICNF [Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas] e dos serviços municipais no sentido de termos de fazer um plano de fogo controlado para o distrito.

Uma das suas frases chave é: os incêndios não se combatem, previnem-se. Há falta de vontade política para não se avançar?
O facto de ainda não termos conseguido resolver estes problemas estruturais dos incêndios rurais tem a ver com a nossa – de todos os que estamos envolvidos - inabilidade e incapacidade. Temos as ferramentas, temos capacidade humana, temos doutrina. O que

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