Opinião
A (im)popularidade do popular
A(im)popularidade do popular sempre que meintroduzo aos meandros da reflexãosociológica, analiso “A ruptura com o sensocomum nas ciências sociais”, um texto lapidardo investigador Augusto Santos Silva (1986). Passadastrês décadas, esta reflexão sobre o distanciamento quedeve reger qualquer investigação conserva toda a suapertinência.
Entre outras coisas, lembra quão perigosoé julgar outras épocas e condutas com os nossosquadros mentais. Embora não possamos fugir ao“aqui e agora” em que cada um de nós vive, oetnocentrismo é um dos atalhos mais directos paraideologias de cariz racista, fanatismos religiosos eoutras aberrações da mesma índole.
Mas tambémexiste, no interior de cada nação, um certoetnocentrismo de classe que faz com que uns e outros olhem de esguelha para as práticas culturaisrespectivas.Há meses, o ministro Augusto Santos Silva afirmou nunca ter conseguido “cumprir um dos [seus]sonhos sociológicos que foi assistir a um concerto deTony Carreira”.
Esquivava assim uma resposta à polémica entre o cantor e as autoridades portuguesas,na sequência da alegada recusa da Embaixada de Portugal em Paris em albergar a cerimónia de atribuição do grau de Chevalier de l’Ordre des Arts etdes Lettres, ao contrário do que acontecera em 2004,em idênticas circunstâncias, com a fadista Mísia.
Aintransigência do Embaixador e a resposta do Ministrodos Negócios Estrangeiros levantaram suspeitas de um preconceito de classe contra a cultura popular. Vislumbrando para além da espuma da actualidade, este caso é sintomático das questões de legitimidade cultural que perpassam o espaço público.Nos anos 60, a partir do conceito de “violência simbólica”, Bourdieu analisou os mecanismos de reprodução das hierarquias sociais, mostrando como os actores em posição dominante conseguiam imporas suas produções culturais como as mais legítimas.
A legitimidade traduz-se em termos de juízo social relativamente ao gosto (o seu e o dos outros). Assim sendo, as elites consumiam uma cultura erudita (música clássica, jazz, etc.), menos prezando as classes populares incapazes de apreciar outra coisa que não folclore, música ligeira e pop/rock. ...
*Paulo Henrique
*Coreógrafo
*Segue as regras do Acordo Ortográfico 1990
Leia mais na edição impressa ou torne-se assinante para aceder à versão digital integral deste artigo